Deixou cartas (à família e à namorada) e enforcou-se na noite de 11 de Janeiro último, num pinheiro junto à casa onde vivia com os pais, em Adaúfe, Braga. Tinha 15 anos, estudava e era acompanhado por psicólogo. Por se tratar de suicídio, a PJ nem se deslocou ao local da morte. O caso ficaria por ali, não tivessem as humilhações na escola tido eco na comunicação social. Só na quarta-feira seguinte as autoridades decidiram investigar.
Humilhações
Havia tempo que Nélson Antunes era vítima de agressões e humilhações repetidas por alguns colegas na escola EB 2+3 de Palmeira, Braga. Por várias vezes, o adolescente verbalizou estar à beira de desistir e falou em suicídio. Na sexta-feira anterior, foi deixado seminu no recreio da escola. Sábado à noite matou-se.
“Brincadeira”
Nenhum responsável quis prestar declarações à tvmais e o director escolar classificou as humilhações de “uma brincadeira dentro da escola”. Apesar desta classificação dada pelo director, aquelas humilhações assim são vistas com preocupação pelos especialistas. Até o pároco de Adaúfe afirmou recentemente que não foi dada importância aos sinais de alerta. O presidente da Comissão de Protecção de Menores reconheceu que Nélson foi acompanhado em 2012 mas que não foram detectados quaisquer sinais de bullying.
Na dúvida, agir
Alguns colegas de Nélson afirmaram à tvmais que “ele era aparentemente feliz. No autocarro vinha sempre bem–disposto”, mas um outro refere que ele andava desesperado. Se detectar que um jovem se aproxima de raciocínios suicidas, aja, antes que seja tarde. Falar com ele sobre isso desencoraja-o a actuar, ajuda-o a quebrar o isolamento, a expressar o seu sofrimento e a vislumbrar outras saídas.
Conselhos
• Expresse-lhe disponibilidade para o ouvir sem o julgar. Evite pressas. Reconheça-lhe a legitimidade dos problemas. Não minimize as dificuldades do jovem. Para quem sofre, os problemas são sempre grandes.
• Ajudá-lo é explorar com ele possíveis soluções e acções concretas. Fortaleça-lhe a autoestima. Incentive-o a assumir as actividades de que ele gosta.
• Um estranho está em melhores condições para ajudar a pessoa suicida. Mas não tome essa missão sozinho. Procure ajuda de pessoas qualificadas. Lembre-se que a família deve ser envolvida, sempre que possível.
• Nos adolescentes há o mito de que os adultos não podem ajudar. Garanta que ele não será gozado, punido ou julgado moralmente. Mas não faça promessas que não pode cumprir.
Os especialistas que consultámos são unânimes em dizer que o suicídio na adolescência é o que tem menos atenção e visibilidade. Dizem-nos que a adolescência é um dos períodos mais propícios ao suicídio e que as humilhações entre pares (bulying) são quase sempre, mas apenas, o último dado. Um detonador, por vezes fatal, num estado de espírito desesperado, onde o corpo e a mente estão em plena revolução. Para Paulo Sargento, professor de Psicologia Forense da Universidade Lusófona, o papel dos “contínuos” na escola é vital e, contudo, em Portugal quase “não existe”.
O papel dos “contínuos”
“De quatro em quatro anos, a Organização Mundial de Saúde publica um estudo feito em 28 países europeus sobre a saúde comportamental em jovens (dos 10 aos 18 anos). Dois dados são permanentes nos relatórios: 1 – O recreio é o espaço escolar onde se pratica mais violência. 2 – As assistentes operacionais (antigas contínuas ou auxiliares de educação) são a personagem escolar de quem as vítimas menos sentem protecção e a quem os agressores menos respeitam. No projeto que o meu grupo clínico mantém com a Câmara de Lisboa constata-se que esta situação também se verifica em crianças com menos de 10 anos. Os métodos de vigilância não são eficazes em espaço de recreio e o facto das vigilantes serem mulheres não espelha de forma evidente a autoridade perante os agressores e, consequentemente, não dá segurança às vítimas. Resta dizer que estas profissionais, no quadro do Ministério da Educação não têm uma carreira definida, não fazem formação específica, ganham o salário mínimo e só aceitam esta função quando não têm mais nenhuma oportunidade de trabalho. Mal vai a educação assim!”
Chamam-lhe bullying
Diversos actos de violência, quer física quer psicológica, praticados de forma intencional e reiterada, por um ou mais indivíduos sobre uma determinada vítima. Recentemente, outro adolescente, de 12 anos, cometeu suicídio no rio Tua, precisamente por sofrer na escola.