De coração cheio e sem mostrar ressentimentos, Sérgio Praia esteve no “Você na TV!” e falou sobre a infância e adolescência, passada no Furadouro, onde alimentou o sonho de ser bailarino clássico. Uma prática que conseguiu exercer durante “quatro ou cinco anos, sem ninguém saber”.
“A minha família sempre foi contra”, lembrou em conversa com Manuel Luís Goucha sublinhando que, naquele tempo, esse desejo “era associado a coisas menos boas para eles. Não era uma profissão do futuro para mim… Nem para ninguém, masculina principalmente”.
Contudo, com a ajuda de uma professora de ballet, Isabel, Sérgio conseguiu ir praticando a arte de dançar. “Escondia as sapatilhas e as meias no fundo de uma gaveta da minha mesinha de cabeceira”, contou recordando o dia em que a mãe descobriu o seu segredo e como isso o motivou a ir-se embora. “A reação não foi boa. Ela queimou tudo e aquilo doeu-me”, começou por referir sublinhando que a postura dos pais “cimentou a vontade de querer sair dali e emocionar o país e o mundo”.
E assim foi. Com “40 contos” no bolso que roubou ao seu pai, Sérgio fugiu de Trancoso e tentou a sua sorte longe da sua terra. “Lembro-me que levei umas sapatilhas de ballet e fui para a frente ao Teatro Nacional de São João, no Porto, fazer sequências de bailado que eu tinha aprendido, para ver se alguém me chamava”, refere. Mas tal nunca aconteceu e o adolescente de 16 anos viu-se obrigado a viver na rua e a procurar trabalho nas obras. “Entrava à noite nas obras para ter onde dormir!”
Sobre a terra que o viu nascer, Sérgio conta que “nunca mais” lá voltou. “Regressei apenas a Ovar para acabar o 9º ano e conseguir entrar na Escola de Teatro”.