Vá lá, já falta pouco. Domingo acaba-se esta romaria de pobreza previsível que tem sido a campanha eleitoral para as presidenciais. Os resultados de audiências nas televisões, por exemplo, dão uma boa imagem do desinteresse geral. Acrescente-se as conversas de circunstância que todos ouvimos na rua, e temos bem a noção de que toda a gente se limita a esperar que isto acabe depressa. Há dois factores de fundo que explicam o essencial, mas não serão os únicos. A saber: a noção de um certo vazio de poder da cadeira de Belém (no sentido prático de que não legisla), e, sem dúvida, a crise, que não estando ainda presente em toda a sua pujança, trouxe há muito um sentimento de desconforto por antecipação. Uma grande maioria de portugueses não consegue pensar noutra coisa que não nessa angústia, real ou premonitória. Neste quadro, torna-se de facto difícil aos candidatos, andar a pregar virtudes pelas ruas, ou a prometer o que todos sabemos que não estará nas suas mãos. Se os portugueses normalmente já não têm grande fé, desta vez falta-lhes ainda uma grande dose de paciência, típica dos deprimidos. Ora, sendo a missão difícil, o nível geral tornou-a mais complicada e desinteressante. Defensor Moura mostra que não tem grande interesse em abandonar o carácter regional da sua investida, provando que estas eleições são apenas uma forma de ter palanque para falar. Falta-lhe máquina partidária, é certo, mas não se vê nenhum esforço de ir para além das suas fronteiras de segurança. José Manuel Coelho cumpre a intenção, nem disfarçada, de nos divertir com a frontalidade das suas farpas, embora todos saibamos que depois de domingo pouco mais ouviremos falar dele. Francisco Lopes consegue a difícil proeza de nos demonstrar que ainda há cassetes no PCP. Muito mais do que o próprio secretário-geral, Lopes não acaba uma frase sem referir o grande capital ou o aparelho produtivo. De Fernando Nobre poderia esperar-se um pouco mais. Ele é, desta vez, aquela figura que nas últimas eleições tem sempre lugar marcado, alguém que surge como uma espécie de mandatário da sociedade civil (seja lá isso o que for), e que não se cansa de pregar contra os partidos: uma forma de atacar todos os que, num momento ou outro, mandaram ou mandam no país. Restam os dois únicos verdadeiros candidatos, que não souberam, também eles, evitar as quezílias pequenas e inúteis, e desataram a atacar e contra-atacar o carácter do outro. Mas Manuel Alegre deveria sentir já, por esta altura, que de pouco servirá tentar reduzir Cavaco a um "mero economista", numa altura em que os portugueses precisam mais de economistas do que de poetas, sobretudo aqueles que atiram intenções de forma demasiado generalista para se perceber exactamente o que podemos esperar deles. Quanto a Cavaco, estranho um inesperado nervosismo à entrada para a recta final da campanha, que o fez utilizar a triste e tradicional viragem de agulha para os jornalistas. Não lhe ficam bem acusações infundadas, sobretudo quando vêm como insinuações. Dizer que "não sabe se as maravilhosas marés humanas que o acompanham por toda a parte estão a chegar a casa das pessoas" é dizer aos portugueses que devem desconfiar da comunicação social. É ainda mais grave dizer depois que não sabe porque realmente não viu televisão por esses dias. Ora, esta precipitação revela uma lacuna básica numa máquina eleitoral. Ainda que não tenha visto, pessoalmente, o que passou ou não para os portugueses, não lhe faltam assessores e conselheiros, muitos deles com a missão, precisamente, de monitorizar a forma como a campanha é transmitida. Se ninguém na sua máquina vê os telejornais, deveria ver. Se viu e conclui que se esconde alguma coisa aos portugueses, é mentira desleal.