![Liberdade, às vezes](https://images.trustinnews.pt/uploads/sites/3/2019/06/10188421Liberdade-%C3%A0s-vezes.jpeg)
Antes de referir que John Galliano é um atrasado mental, importa perceber o que penso eu do chamado "mundo da moda": uma das maiores patetices pós-modernas. Uma vazio dentro do vácuo. Bem sei que há muito pensador que gosta de colocar a coisa ao nível da arte, porque (dizem-nos) no fundo simboliza também uma "representação do mundo", através das suas famosas "tendências", mas lamento, comigo não cola. Porque tirando as fotos e vídeos de miúdas raquíticas, hermafroditas zangados com a vida, e toda a tropa que os acompanha e suga, o máximo que ouvimos, quando os estilistas são chamados a elaborar pensamentos sobre a sua "arte", é que este ano o branco é o novo preto, ou que o lilás ou os cortes em viés estão proi-bi-dos. Vamos cá a ver uma coisa: é só roupa, pessoal, relaxem. Dito isto, não me admira minimamente que este "mundo fascinante" produza personagens que têm tanto de ridículo como de irrelevante. Galliano é apenas um bom exemplo, porque junta tudo, como se fosse um cromo do meio. Excêntrico, excessivo, desregulado, "um ganda maluco", como convém a quem se julga acima da banalidade cinzenta dos nossos dias e das nossas pobres vestes. Era certo e sabido que o excêntrico, um dia, haveria de escorregar nas armadilhas em que vive, regadas a álcool, comprimidos, cheiros e pós. Para compor o quadro de estereótipo, Galliano é um daqueles absurdos embaixadores da homossexualidade, a agitar espalhafato, sempre envolto em olhares lânguidos de cariz sexual. Ainda não percebi porque é que uma fatia tão grande de homossexuais acha que nos deve confrontar, a qualquer gesto ou palavra, com uma imagem de predador voraz, ou potencial presa passiva; seja qual for o papel, enfiam-nos pelos olhos dentro que estão sempre no flirt, sempre prontos para a brincadeira. Mas isso fica para outros carnavais, já que, no caso que interessa, a sua habitual pose não é determinante. Embora, atenção, não seja totalmente irrelevante. Caiu o Carmo e a Trindade quando se soube que Galliano já teria entrado por caminhos ínvios, com comentários racistas. A casa Dior já tinha lançado uma primeira advertência. Mas ainda faltava a cereja em cima do bolo: Galliano é filmado num restaurante por um casal (de judeus,presume-se), a quem vai dizendo, na voz pastosa de quem não faz ideia do que faz, que ama Hitler, e que eles (o casal, presume-se) já teriam sido gaseados se o ditador ainda por cá andasse. Lamentável? Sem dúvida. A começar, lamento, pelo facto de um casal filmar um bêbado que não faz ideia do que diz, ou, se calhar, de onde está. Mas lamentável, sim , o teor das declarações do estilista, como o são sempre que abrem a boca os embriagados ou drogados, se calha estarem a curtir a viagem. O sururu foi o que se sabe, as consequências ainda vão no adro, embora o menino-prodígio tenha já sido despedido sem piedade. Parece tudo muito bem, tudo muito normal, muito politicamente correcto. Tirando o pequeno pormenor de Galliano viver e se movimentar numa sociedade que se considera acima das outras, porque defende e pratica aquela coisa…-como é que se chama?- ah, liberdade de expressão. Sabe o que é, certo? Aquilo que faz de nós democratas e não fundamentalistas cegos, como os que ameaçam com bombas sempre que vêem nos jornais um desenho do profeta Maomé. De vez em quando surge um singelo pormenor, uma pequenina pedra no sapato, que nos revela que, afinal, a liberdade de expressão é uma coisa assim, mais ou menos, como convém. De forma mais clara: não tenho mínima simpatia por Galliano, a personagem, enoja-me que, mesmo podre de bêbado, seja capaz de dizer o que disse, mas não estará na altura de um grande, aberto e sincero debate ocidental sobre o que significa, afinal, vivermos em democracia? Porque o que vai ficando, de tudo o que vemos e ouvimos, é um contra-senso: as chamadas minorias (e isso é tão discutível) tanto se queixaram de serem agredidas, que passaram de "vítimas" a legisladores. Você tem liberdade de se exprimir, sim, desde que não utilize as palavras pretos, ciganos, maricas, judeus. De resto, tudo bem. Ninguém se escandalizaria se Galliano, ou qualquer outro palerma, fosse apanhado a dizer que detesta brancos europeus heterossexuais. Se você pertence a este grupo, escusa de divulgar o vídeo. Ninguém lhe vai ligar patavina. Sabe porquê? Porque vivemos numa sociedade livre, e todos têm direito à sua opinião.