Será desta? É do aproximar da Primavera ou já cheira mesmo a eleições antecipadas? Parece esgotar-se rapidamente a letargia de deixar tudo andar, de seguir o seu rumo natural, quanto mais não seja para não "alertar" ou "alarmar" ou "enervar" os "mercados". Coloca-se, então, um problema para o Partido Socialista? Sem dúvida, mas talvez ainda mais delicado, por ironia, para o PSD. Pela simples razão de ser virtualmente impossível, por agora, uma confiança simples em sondagens, ou "tomadas de pulso" à sociedade. As sondagens, que já são o que são, tantas vezes voláteis e inseguras quando parecem afirmar indicadores muito concretos, apresentam-se, à partida, de altíssima imprevisibilidade, sobretudo quando vemos o número de indecisos, ou que não respondem. É certo que apontam para a vitória do PSD, ou seja, para uma mudança no país. Mas…com que expressão? Com que leituras dos números? O PSD ganha, mas tudo indica que a vantagem confortável que tinha há meio ano se vai esbatendo, diminuindo. Ou seja, que se terá subestimado a capacidade de sobrevivência do PS, ou melhor, de José Sócrates. Depois, há o problema da "janela de oportunidade". Compreende-se, por um lado, o compasso de espera do PSD, que apostou num governo que se auto-desgaste lentamente, à vista de todos os portugueses: depois, seria só apanhar a onda do descontentamento. Acresce que Cavaco Silva só voltou a tomar posse há dias. Só agora poderá ponderar, a sério, se pensa lançar a bomba atómica da dissolução do parlamento. Mas…quando tudo isto parecia certo como um relógio suíço, eis que, no meio de tantas medidas duras de austeridade, tanta contestação nas ruas, tanta demonstração de mal-disfarçada arrogância (como a maneira como falou daqueles jovens que perturbaram um jantar em Viseu) Sócrates lá se vai aguentando. "Aguentar" não será vencer umas eleições, se as houver brevemente, mas conseguir um resultado que pode bem empalidecer a alegria do PSD, para quem tudo o que não seja uma maioria absoluta inequívoca não corresponderá a varrer o PS do poder. Ou seja, ironia do destino e do tempo: Passo Coelho parece ter evitado um confronto à espera de crescer, mas pode bem ser lançado para ele quando…não cresceu tanto quanto isso. À hora a que escrevo, o presidente do PSD pediu uma reunião com o Presidente da República, poucos dias depois de se ter afastado da aliança de não-agressão que tinha com o PS. Parece indicar que o PSD vai dizer Basta, vamos então para eleições e que ganhe o melhor. O pedido de audiência é Cavaco Silva é duplamente significativo. Não se trata de ir apenas falar com o mais alto representante da Nação, mas sobretudo com alguém que utilizou a recente tomada de posse para o mais inequívoco discurso de censura ao governo dos últimos tempos. Passos Coelho sabe que se há um tempo para conseguir o músculo de Cavaco, esse tempo é agora, que o Presidente parece também farto e tem sido mais directo que o próprio Passos a demonstrá-lo. A propósito: parece-me evidente que a estratégia de Passos para dentro do próprio partido terá de ser mais…evidente. Já se sente no ar alguma falta de paciência com algumas hesitações generalidades a mais. De início, Passos parecia ter a segurança de um general paciente, que sabe esperar e só revelará o seu jogo mais tarde, agora, já o dizem alguns barões laranja, parece mais alguém que desde o início não sabe muito bem como agir, limitando-se a reagir, e quase sempre de forma previsível. Uma coisa é certa: sendo certo que o país está de rastos, e o PS com ele, o PSD não terá muitas mais oportunidades como esta. Talvez esta pressão da goleada seja precisamente o problema. Sócrates sabe disso, e vai sorrindo. Ele que atravessou o Freeport, o Face Oculta, mais isto e aquilo, sem esboçar um sinal de desistência, venderá cara a derrota a um PSD demasiado triunfalista. E irá certamente para a luta desafiando Passos a admitir aos portugueses que as medidas de austeridade são mesmo necessárias, seja qual for a cor do governo.