Na porta do número 15 da Rua de Moçambique, em Beja, está um edital. Quem pretender herdar os bens da família Esperança deve anunciar-se às autoridades. Os anos passam, o património deixado é conhecido da família, mas ninguém quer assumir esse papel. A loja de lingerie da família Esperança, no centro de Beja, é agora uma loja de acessórios. A casa está ao abandono, o carro de Francisco Esperança guardado na garagem de um irmão. Mas formalmente ninguém herdou nada. Uma das irmãs de Benvinda Esperança (a mulher de Francisco) confessa que a família apenas retirou roupas e algumas mobílias. A casa não foi vendida. Nem pode. É preciso fazer a habilitação de herdeiros e ninguém se apresenta como tal. Ao juiz de Instrução Criminal, Francisco disse que matou a família para evitar que ela sofresse devido aos seus problemas financeiros, que estava afundado em dívidas ao banco e prestes a perder os seus bens, pelo que terá assassinado os familiares para os proteger desse processo de perda. Mas até hoje não há qualquer dívida conhecida nem nunca alguém reclamou qualquer dívida. Se o tempo continuar a passar sem que alguém se assuma herdeiro, os bens da família Esperança revertem a favor do Estado.
“Turismo macabro”
A casa, hoje abandonada, tornou-se num local de romaria. Uns visitam-na apenas para ver o sítio onde ocorreu a violenta tragédia, outros sentem-se atraídos por lugares que foram palco de crimes violentos ou trágicos acidentes. A família das vítimas quer recuperar a paz que outrora tinha e diz não ter superado, por nunca ter encontrado uma explicação plausível para a tragédia.
A morte da família Esperança
“Isto só termina quando eu morrer”, disse Francisco Esperança, quando foi detido em Beja. Dias antes (12 de Fevereiro de 2012), a polícia entrara pela casa de dois pisos, no numero 15 da rua de Moçambique, e encontrara marcas de sangue que levavam a três vítimas todas golpeadas no pescoço, na cabeça e nos braços. Uma (53 anos) num quarto, as outras duas abraçadas (28 e 4 anos), num outro. Preso, Francisco Esperança entrou às 19 h no Estabelecimento Prisional de Lisboa. Entregou aos guardas os bens pessoais e “foi visto por um enfermeiro, estava calmo, consciente e orientado”, disse na altura Rui Sá Gomes, director-geral dos Serviços Prisionais. Às 21 h, foi colocado numa cela de vigilância e observação. Apareceu morto à 1 h, envolto nos lençóis. Mas, ao contrário do que disse à polícia, nem tudo terminou com a sua morte.
Mistérios
O mistério da paternidade da neta ficará em aberto para sempre. Vozes da época falaram que Francisco Esperança seria o próprio pai da neta. O namorado de Cátia foi dos últimos a falar com ele. Pedro Rodrigues, funcionário da Carris, conheceu Cátia no Hospital de S. José em Lisboa, onde ambos estiveram internados. Pedro propôs casar-se com Cátia. Quis saber a verdadeira história da paternidade da filha desta (Maria, 4 anos), mas isso era tabu para ela. Maria Tomás nasceu a 23 Março de 2007. Foi registada assim porque nessa época Cátia namorava um Tomás. Mas os testes de ADN haviam de revelar-se negativos quanto a este homem. Suspeita-se que Francisco fosse pai-avô. Com a morte deste o mistério perdurará.
E mais mistérios
Os 150 mil euros que este homem tirou ao banco onde trabalhava também nunca apareceram, apesar de ele ter estado preso por isso. Licenciou-se em Direito na prisão. A mulher monta uma loja de roupa. A filha tentou o suicídio a 13 Março de 2011, lançando-se da varanda de casa. Dois anos depois, morreu um homem num acidente rodoviário com Francisco. Uma semana antes de ter morto a família, Francisco levou-a de férias a Espanha e a Coimbra. No dia do crime, Francisco Esperança levantou da conta do banco 5600 euros. Quantia que lhe foi apreendida pela polícia e que estará à ordem de um futuro herdeiro. Dois anos passados sobre todas as mortes, ninguém consegue explicar, esquecer ou habilitar-se a herdar…