Na televisão, seja qual for o pano de fundo, os "analistas" adoram desatar a fazer comparações, e a atribuir pontuações, ainda que o cenário seja a catástrofe madeirense, ou o Haiti, e outros e outros antes destes. Desde o primeiro minuto, como se estivéssemos nos Jogos Olímpicos, elogia-se os que "chegaram primeiro", em comparação, claro, com os mais lentos. Não me entendam mal: como espectador, anseio naturalmente por notícias o mais completas possível a partir do momento que sei que se verificou uma qualquer desgraça que desafia o nosso entendimento. Como profissional, e gestor de equipas, procuro naturalmente fazer chegar o mais depressa possível a pessoa ou pessoas certas ao local. Mas recuso entrar no jogo perverso de passar rapidamente de um interesse humanista pelo acontecimento para uma fria competição entre profissionais de comunicação. É, aliás, a velha história do foco do protagonista: vivemos numa era em que se dá mais atenção ao jornalista que cobre uma acção perigosa do que às verdadeiras vítimas de um qualquer conflito. Regressando ao meu foco, parece-me menor a questão do "quem chega lá primeiro" (quando estamos a falar de pouco tempo, claro) do que o verdadeiro jornalismo: como se faz as reportagens, com que tom, com que enfoque, com que novidades, com que investigação, com que perguntas. E isto é tanto mais importante quando vivemos uma época em que, notoriamente, qualquer competição entre jornalistas é batida pelas testemunhas locais. Hoje em dia, não há acontecimento trágico onde não haja alguém munido de uma câmara para filmar e colocar na internet, como tem ficado provado. Se isto bastasse para jornalismo, nem precisávamos de nos mexer, quanto mais andarmos a correr para ver quem chega primeiro. Mas mais enervante do que a competição do Quando, é sem dúvida a corridinha do Quem. Uma cronista de televisão admirava-se, elogiando, porque as televisões enviaram pivôs. Dizia até que lhes fazia bem molhar ou sujar os pés, não me lembro bem, e olhar as pessoas nos olhos, em vez do "conforto" da cadeira do estúdio. Enfim…Em primeiro lugar, convém lembrar que um pivô é apenas mais um jornalista de uma Redacção. E que, na sua maioria, deram provas em reportagem ou directos antes de passarem a maior parte do seu tempo no estúdio. Ou seja, não estarão naquele momento a fazer algo que nunca fizeram. Mas, e para mim o mais importante, é a ideia de que uma estação marca muito mais pontos do que a outra se mandar o seu pivô fazer o Jornal no local. Permitam-me a pergunta: na maior parte dos casos, o que é que isso adianta à qualidade da informação? Em que é que um pivô ao vento, normalmente com um cenário indistinto de breu, torna a informação mais sólida do que se estiver em estúdio? E, sobretudo, que adianta ter lá um pivô se o mais importante (as imagens, as entrevistas, as reportagens, as interrogações) forem uma coisa pífia? Mas está visto que é a solução que mais impressiona os analistas: pontuam mais um pivô que até apanha vento e aguenta um desconforto (mais uma vez o foco do protagonismo perverso) do que alguns jornalistas ou repórteres de imagem que nos trazem o momento do dia, por vezes o momento que define a situação, e que a tornará inesquecível aos nosso olhos e ouvidos. Mas, enfim…hoje o jornalismo não vale tanto como outros pormenores.