Negou ser estripador e negou ter assassinado Filipa Ferreira, 18 anos, em Cacia, Aveiro. Mas é por ser suspeito deste crime que José Guedes está em prisão preventiva desde 23 de Novembro. Ser ou não o estripador de Lisboa, como contou a uma jornalista, não conta porque o crime prescreveu (ver caixa). Sobre a morte de Filipa, José alegou em sua defesa estar a trabalhar no Porto naquela data (2000), não tendo forma de se deslocar ao local do crime, por não ter carro. Ficou preso em preventiva por via de uma ameaça de voltar a matar que terá feito por mensagem de telemóvel. A defesa de José já recorreu para o Tribunal da Relação do Porto.
Reality segredo
Tudo terá começado com Joel Guedes, filho do autodenominado estripador de Lisboa. O seu filho Joel candidatou-se a “Casa dos Segredos 2” com um segredo: “Sei quem é o estripador de Lisboa”. Esta candidatura, apesar de “desconsiderada” pela produtora, foi soprada para fora do programa e deixou de o ser… As próprias vizinhas de Joel confirmam o que a mãe deste e mulher do alegado estripador, Nazaré, disse: “Foi uma brincadeira. Ele queria ir ao programa e inventaram tudo”. Ao “Correio da Manhã”, Joel, 21 anos, disse que os diários do pai foram escritos durante o jogo Portugal-Bósnia. Ao programa “Querida Júlia”, da SIC, o mesmo Joel contou esta semana que o pai disse: “Vou mandar uma mensagem a dizer que esta sexta-feira aparece mais um corpo”. Contou ainda que o pai escreveu os diários à pressa com os jornais da época à sua frente. Dizem que Guedes colecciona jornais com o tema do estripador de Lisboa. As vizinhas sublinham o carácter violento de José Pedro Guedes, o pai de Joel, e contam as agressões que este faz a Nazaré. As dúvidas quanto ao facto de este José ser o estripador são ainda muitas.
ADN ou nada
José Pedro Guedes, 46 anos, está preso preventivo na cadeia de Aveiro, suspeito da morte de Filipa Ferreira, prostituta, 18 anos, que apareceu morta por asfixia (com as meias na boca) numa casa em obras, em Cacia, Aveiro (Janeiro de 2000). José arrisca 25 anos de cadeia. Os vestígios biológicos encontrados no corpo de Filipa, em 2000, foram recolhidos e guardados, até hoje, no Instituto Nacional de Medicina Legal, em Coimbra. Através deles sabe-se que a jovem terá sido violada antes de ser morta por estrangulamento. A comparação desses vestígios com o ADN de José Guedes já está a ser feita e deverá indicar se este praticou o crime ou não. Os resultados devem demorar apenas alguns dias. Ao juiz de Instrução Criminal, José negou o seu envolvimento nesta morte e na de três prostitutas em Lisboa (1992 e 1993). Mas não explicou porque é que disse a uma jornalista do “Sol” ser o “estripador de Lisboa”, descrevendo até a forma como matou as mulheres.
Mau estar na PJ
Antigos investigadores recusam aceitar que José seja o “estripador de Lisboa”. “Apenas sabe disso pela imprensa. Provavelmente, tem uma fixação pelo caso. Daí a ter sido ele, falta que conte os detalhes que conhece. Mas detalhes que só nós conhecemos. Não os que já foram publicados”, disse esta semana um antigo inspector da PJ à tvmais. O próprio Teófilo Santiago, actual director da PJ de Aveiro, já sublinhou que o homem confessou os homicídios “num outro contexto”. Ou seja, num contexto nem judicial nem policial.
O estripador de Lisboa
Nunca foi descoberto. Chegou, viu, matou e fugiu. Ou morreu. Pelo meio deixou um rasto de horror, plantado no corpo de três prostitutas. Pelo menos. Para a história, ficará como uma das investigações mais frustrantes da história da investigação criminal portuguesa. “O Estripador de Lisboa”, escrito antes dos factos.
No mínimo, um livro perturbador que apresenta incríveis coincidências com a realidade que viria a acontecer. No livro, as vítimas são quase todas prostitutas e tinham relação entre si. Eram esquartejadas e mutiladas pelo agressor, que jamais foi apanhado. Até a descrição das cenas parece quase uma antevisão do que aconteceria mais tarde, na década de 90. “Essa primeira rapariga chamava-se Cândida e estava empregada no cabeleireiro do centro comercial. A última vez que alguém a viu foi à saída do autocarro, cerca das 00.20 h, quando se apeou junto ao parque de estacionamento de camionetas de Odivelas, no regresso a casa. Vieram a descobri-la na manhã seguinte, atirada para uma barraca abandonada depois das últimas cheias, nas traseiras de um prédio clandestino construído junto à ribeira. Mas aquilo que de lá retiraram correspondia só em parte a Cândida, tal como ela fora em vida. Faltava-lhe um seio e tinha o ventre tão retalhado que os intestinos se espalhavam pelas pernas abaixo. A cobri-la, apenas uns retalhos de roupas que usava.” Esta é uma das passagens do livro, onde se percebem claras semelhanças, com as do cenário dos crimes investigados. Foi editado pela EuroPress, uma editora com sede na Póvoa de Santo Adrião, em Odivelas. Um dos sítios onde apareceu uma das vítimas. Antes de os homicídios terem sido cometidos, o livro contou factos muito parecidos com o que viria a acontecer. O seu autor, Luís Campos, foi investigado pela PJ. Professor no Instituto Superior de Agronomia, assinou “O Estripador de Lisboa”, em 1984. Outra descrição explica que (à semelhança daquilo que viria a acontecer na vida real) o assassino esventrava as vítimas ainda com vida, mas só depois de as deixar inconscientes. É mais um ponto de contacto com os actos do “estripador de Lisboa” – “A Márcia foi encontrada no quarto independente onde vivia, na zona do Martim Moniz. Estava nua e picada desde o queixo até à barriga por uma lâmina afiada. Tivera por certo uma morte lenta, mas a polícia possuía razões para crer que estava, nessa altura, sob o efeito de droga e inconsciente. De qualquer modo, a carpete por onde se arrastara em ziguezagues e rodopios e o sofá onde finalmente o suplício acabara ficaram todos rendilhados por fiozinhos de sangue saídos de cem buraquinhos”. As investigações da PJ ao autor desencadearam resultados absolutamente estéreis. Luís Campos viria a falecer em 2001, vítima de doença prolongada.
Vítimas
Prostitutas, frequentadoras das mesmas áreas em Lisboa (Técnico, Defensores de Chaves, 5 de Outubro), baixa estatura, franzinas, morenas e toxicodependentes. Cristina, 22 anos, morta a 31 de Julho de 92. Ângela, 22 anos, apareceu junto a uma lixeira. Fernanda, 24 anos, encontrada a 27 de Janeiro de 93 num barracão em Entrecampos (deixou dois filhos, uma menina de 6 anos e um bebé com 1 mês).
Pistas
“O estripador foi ou ainda é, no caso de estar vivo, um indivíduo inteligente, frio e calculista”, diz João de Sousa, o inspector-coordenador da PJ (já reformado) que primeiro dirigiu a investigação. Ao longo dos anos, a Judiciária investigou centenas de pistas e mais de duas dezenas de suspeitos, entre estes um professor catedrático de Medicina, um escritor, um funcionário de medicina forense, um técnico de telecomunicações e um outro de electrodomésticos. Fizeram um retrato-robô, empenharam inspectores a tempo inteiro e em exclusivo e o próprio FBI enviou a Lisboa dois peritos. Nada.
Impressionou Sombreireiro
O assassino “nunca terá mantido relações sexuais com as vítimas” foi a convicção com que ficou o dr. Sombreireiro. O médico-legista que realizou mais de 40 mil autópsias ao longo dos 36 anos em que esteve ao serviço da Medicina Legal, dr. José Sombreireiro, afirmou a este repórter, à época, ter ficado impressionado com o que viu na autópsia das vítimas. Na altura, disse-nos, que o estripador as estrangulou com as próprias mãos e que os corpos apresentavam um corte na região abdominal, a partir do qual o assassino lhes extraíra vísceras.
ADN – arma científica
O ADN contém todas as informações genéticas dos seres vivos. A estrutura da molécula de ADN (Ácido Desoxirribonucleico) foi descoberta por James Watson (EUA) e por Francis Crick (Inglaterra) em 1953, o que lhes valeu o prémio Nobel de Medicina em 1962. A análise de ADN é uma das “armas” da polícia científica moderna e da investigação criminal. Nos humanos é composto por 23 pares de cromossomas e não existem dois perfis de ADN iguais no mundo. A comparação serve sempre para distinguir pessoas…