Da investigação levada a cabo “não resulta que a morte de Maria Fernanda Bandeiras tivesse origem em acto imputável a terceiros”, lê-se nos autos, arquivados, a que a tvmais teve acesso. Maria Fernanda Bandeiras, a mulher do artista conhecido por Paco Bandeira, disparou um tiro na cabeça às 22 horas do dia 10 de Março de 1996 e viria a falecer no hospital às 2.20 h do dia seguinte. Nos autos, estão as diversas diligências desenvolvidas pelas autoridades, como a conclusão da autópsia, declarações de Paco Bandeira, dos irmãos de Maria Fernanda, das suas filhas e genro e até do bombeiro que prestou os primeiros socorros e a levou ao hospital. Lê-se ali que “jamais saberemos se Maria Fernanda pôs termo à vida por um acto impulsivo”. Maria Fernanda esteve casada com Paco Bandeira 37 anos. O suicídio ocorreu na casa de ambos, na Quinta da Boavista, no Lourel, Sintra. Paco Bandeira estaria no quarto a ver televisão, enquanto Maria Fernanda se preparava para o acompanhar à tomada de posse do Presidente da República, Jorge Sampaio.
Autópsia
O relatório da autópsia revela que a morte foi devida a graves lesões traumáticas crânio-encefálicas produzidas por uma bala disparada à queima-roupa debaixo para cima, da direita para a esquerda e de frente para trás, inexistindo sinais de defesa activa ou passiva, detectando-se vestígios de pólvora nas pregas interdigitais da mão direita, admitindo-se como etiologia médico-legal da morte o suicídio.
Invulgar
Maria Fernanda tinha marcas de pólvora na mão direita e todos declararam ser destra, com excepção do seu irmão Francisco (ver caixa), que declarou às autoridades que a irmã tinha facilidade em desempenhar diversas tarefas com ambas as mãos. É invulgar que o projéctil que atingiu o crânio de Maria Fernanda nunca tenha aparecido. Como é invulgar que pouco depois de Maria Fernanda ter sido levada para o hospital, o local onde tudo decorreu começasse a ser limpo. É também invulgar que as suas roupas tenham sido retiradas à família já depois de lhe terem sido entregues. Não esteve perito da investigação criminal no quarto onde Maria Fernanda se suicidou, na propriedade da família Bandeiras, no sítio do Lourel em Sintra. Mas foi com base na conjugação de todos os factos apurados que as autoridades concluíram ter havido suicídio.
Lê-se
A avaliar pelo que consta nos autos, naquela noite, Paco discutiu com a sua mulher “por razões familiares”. No calor da discussão, que decorreu no quarto, Maria Fernanda empunhou um revólver, apontou a arma à sua própria cabeça e exclamou “Queres ver como sou capaz?!”, após o que premiu o gatilho disparando, caindo de seguida no chão com a arma ainda na mão. Foi assim que Paco Bandeira contou aos autos e foi assim um dos irmãos da vítima, Manuel, que vivia a dez metros do local da morte, declarou às autoridades. Disse que quando acorreu ao local encontrou a irmã ainda com vida e de revólver na mão. O mesmo que disse Eduardo Silvestre, o bombeiro em Sintra que contou ter encontrado Maria Fernanda ainda “com vida e de revólver na mão direita, deitada no chão junto à cama do quarto”. Foi este homem quem lhe tirou a arma da mão e prestou os primeiros socorros, levando-a para o Hospital de S. Francisco Xavier. A arma estava registada em nome de Francisco Bandeiras (Paco Bandeira), que declarou que Maria Fernanda terá retirado a arma do carro quando o levou à oficina. O revólver Taurus foi entregue às autoridades nessa noite com três munições por usar e uma já usada (leva seis). No laboratório de Polícia Científica apurou-se que foi aquela a arma que foi utilizada no disparo. A bala nunca foi achada.
Reabrir processo
As acusações de violência feitas pela segunda mulher de Paco Bandeira reacenderam lembranças sobre o suicídio da primeira. Francisco Castelo, um dos irmãos de Maria Fernanda, quer uma nova investigação à morte da sua irmã. Nos autos, é identificado como o homem que apontou dúvidas sobre a morte de Maria Fernanda, mas nada acrescentou ou concretizou nesse tempo.Segundo este irmão de Maria Fernanda, a arma que Paco Bandeira usou agora será a mesma que Maria Fernanda usou para se suicidar. Hugo Marçal, amigo de infância de Francisco, foi o advogado que a família contactou em 1996 para acompanhar o caso. “Cheguei a ter os pedidos de novas perícias e o requerimento de abertura de instrução prontos”, diz o irmão de Maria Fernanda que a seguir explica que, naquela altura, a opção da família foi deixar cair o caso, já que a mãe, à data com mais de 80 anos, pediu “para deixarmos a alma da nossa irmã descansar”. Passados 15 anos, os factos estão à beira de prescreverem. A reabertura com base na tese de homicídio depende da decisão de interpor requerimento em tempo útil, ou seja, até Março próximo.
Personalidade paranóica
A perícia psiquiátrica solicitada pelo advogado de Paco Bandeira no âmbito do processo de violência doméstica que a sua segunda mulher lhe moveu revela que o cantor tem uma personalidade algo paranóica, compulsiva e narcísica, com uma referência a uma presença moderada de transtorno delirante. É referido que o músico fala de si mesmo como de duas pessoas diferentes: o Paco artista e o Francisco Bandeiras, e que, por vezes, aquelas duas facetas entram em conflito. Nada que leve os especialistas a diagnosticarem doença alguma do foro psiquiátrico ao cantor.
A discussão
Na noite da sua morte, Maria Fernanda discutia com Paco Bandeira, “por causa de um cheque”, dizem uns, outros dizem que por causa de “uma longa relação de Paco com outra mulher”. Aos autos, a filha de ambos, Maria da Conceição, disse que a relação entre os pais não era especialmente conflituosa e que a sua mãe andava “um pouco ansiosa devido a uma certa tensão decorrente do facto de se sentir um pouco só”. Conceição explicou às autoridades não ter razões para suspeitar do seu pai e afirmou que sua mãe era destra.