
1 A cena passa-se numa universidade privada. Onde não há praxes, pelo menos das do infeliz costume. Uma reunião de alunos. Conversa para aqui, conversa para acolá. Chega a vez de um caloiro pedir a palavra. Para dizer que gostaria muito que a universidade passasse a ter praxes, com respectiva comissão, e duxes, e mais não sei quê. A maioria dos outros alunos insurge-se. Não, não precisamos cá de praxes. O caloiro insiste, calmo mas determinado. Diz que é uma pena, era um dos seus sonhos. Imaginava-se a ser praxado como manda a tradição, para depois poder integrar os mais altos quadros da hierarquia e, naturalmente, passar ele a praxar os que fossem chegando. Só sobre isto haveria muito a dizer… mas nem vou por aí. Pedem-lhe explicações e justificações para a excitação com a praxe. Responde que é o único verdadeiro ritual de integração. Que é assim que se fazem amigos na faculdade, que se forma um laço entre praxados e praxantes. Tentam explicar-lhe que na faculdade há os mais diversos grupos de amigos, que se pode ser amigo de alguém, optando por essa estranha prática de… nos apresentarmos, conversarmos, descobrirmos interesses comuns. Mas ele insiste. Louva essa prática ancestral de festins de humilhação degradante em nome da integração, da aceitação, e outras noções falsas e estúpidas com que os mais velhos enganam os mais novos há muitas e muitas décadas. Só o facto de um jovem caloiro implorar por maus tratos nos devia envergonhar, mas atente-se, sobretudo, ao timing. Qualquer mínimo de bom-senso aconselharia algum recato e resguardo sobre a questão, quando ainda está bem viva a recordação da tragédia do Meco. Ou seja, qualquer um ou uma que, no seu mais íntimo, defenda e deseja as praxes, deveria andar caladinho e escondidinho por uns tempos. Pois é precisamente a altura que o rapaz escolhe para suspirar por rituais avacalhantes. Não seria preciso dizê-lo, mas a falta de sensibilidade e inteligência emocional é mais um pormenor que demonstra o vazio cerebral de muitos que vão crescendo no País, e que, quem sabe, um dia ainda vão ter posições de relevo e poder. E daí talvez não. Se este jovem tiver o futuro de integração que deseja, daqui a muitos e muitos anos ainda se andará a arrastar pela faculdade, a gastar dinheiro aos papás e ao País, à espera de mais e mais caloiros que possa integrar, exercendo o seu pequeno patético poder, que não integra, não tem piada, não traz desenvolvimento, modernidade, progresso ou avanço, e não faz amizades, a não ser uma triste cumplicidade boçal.
2 Será que as coisas estão a mudar no futebol? Espero bem que sim, e que não se deva apenas a reforço notório de dispositivos policiais. Com um campeonato renhido como não se via há muito, os jogos mais escaldantes entre os três grandes não têm trazido grandes confusões ou cenas de violência. Seria bom que assim continuasse, porque é penoso ver tanta bancada vazia apenas porque a maioria das famílias tem receio de ir aos estádios, sobretudo se tiver crianças pequenas. Que venha um tempo em que o futebol seja uma festa e não uma prevista batalha.