A chamada crise do Sporting trouxe para cena mediática algumas nuances pouco ou nada vistas no mundo do futebol, o que não é tarefa fácil, sendo um mundo onde praticamente já vimos ou ouvimos de tudo. Desde logo, esse estranho e desconfortável braço-de-ferro entre um presidente e o treinador que ele próprio escolheu. Aliás, que o próprio apresentou como grande trunfo de uma nova era para o clube. Ainda me lembro da entrada triunfal na sala de conferência de imprensa, os aplausos entusiasmados dos sócios. Menos de um ano depois, é todo um outro ambiente, que custa a crer como alguém suporta. Bem vistas as coisas, o que se passa diante dos nossos olhos é um despedimento anunciado que ainda não foi oficializado, ou pelo menos admitido. Bem sei, bem sei, que Bruno de Carvalho surgiu com ar estupefacto, a dizer-nos que não percebe onde fomos buscar a ideia de que há um problema entre ele e o treinador. Mas fê-lo, naturalmente, apenas e só no canal do clube, numa suposta “entrevista”. Este não é o problema, naturalmente. Num país felizmente livre, o presidente pode fazer ou dizer as coisas como muito bem lhe aprouver, ainda para mais no seu canal. O problema é Bruno de Carvalho, aparentemente, querer negar o óbvio, com a agravante de “culpar” jornalistas por entenderem o que ele próprio quis que fosse entendido desde o início. Foi Carvalho que quis inaugurar um novo estilo: o de vir aos microfones repreender a equipa e o técnico, pedindo inclusivamente desculpa, em determinado fim de semana, pelo comportamento de duas equipas, a principal e a B. Quis, mais uma vez, dar corpo e voz ao que supostamente será o sentimento dos sócios, para quem, desde o início, trabalha. E isto em si não é defeito nenhum, muito pelo contrário. Da mesma forma que um artista deve respeitar o seu público acima de tudo, um presidente de um clube deve pensar o mesmo, e aqui o público serão os adeptos, sócios ou não. Mas isto terá um preço, digo eu… Por momentos, nesse raspanete, o presidente abre uma brecha, e logo entre os adeptos e os jogadores, que devem trabalhar com alegria e entusiasmo para manter os adeptos alegres. A partir desse momento, público e notório, e não no segredo discreto de um balneário, o treinador é, evidentemente, alguém a quem escancararam a porta de saída. Porque se arrasta então a coisa? Pois não sei. Mas poderemos talvez supor que haja dinheiro a condicionar os próximos passos. Calculo que os custos para o Sporting serão substancialmente diferentes, consoante Marco Silva saia pelo seu pé, ou aguarde ser despedido. Logo se verá. Mas é, repito, uma situação invulgar. Como invulgar foi, julgue-se bem ou mal, a forma como Manuel José falou de José Eduardo, que havia escrito cobras e lagartos sobre Marco Silva. Ouvirmos alguém sem quaisquer papas na língua dizer que fulano é um anormal que não presta para nada, também está longe de ser normal, num mundo de recadinhos, ironias e hipocrisias.
Ainda há surpresas no futebol
Bruno de Carvalho surgiu, com ar estupefacto, a dizer que não percebe onde fomos buscar a ideia de que há um problema entre ele e o treinador