
Acompanhei, com relativa atenção, o desenlace das eleições na Grécia. O que se disse antes, e o que aconteceu depois. Ou muito me engano, ou está em marcha um logro. Pode ser que me engane, e os gregos acabam de descobrir a pólvora de uma solução mágica, e mais uma vez farão História. Mas duvido. Vejo levar em ombros o Syriza e o líder Tsipras. Mas parece–me ser mais uma questão de derrotados do que de vencedores. Parece-me que os gregos votaram contra. Quiseram expulsar todo um sistema político tradicional, os partidos do chamado “centrão”, que, lá como cá, foram alternando no poder, sem diferenças significativas. Perante os resultados, a Esquerda europeia atirou foguetes e anunciou que vem aí a mudança. Bom, é curioso que a primeira grande mudança seja da esquerda radical com… a direita radical. Na hora de procurar uma aliança para garantir vitórias no Parlamento, Tsipras chamou o lado oposto do espectro político. Um vale tudo para exercer o poder. Além desta primeira e enorme incongruência, “justificada”, de forma pobre, com o facto de esquerda e direita estarem unidos no ódio à troika, causa ainda maior incompreensão que o radicalismo da campanha dê agora lugar à procura de diálogo construtivo com a União Europeia. Em que ficamos? Então não era para partir isto tudo? Agora quer-se consensos pacíficos e já não se equaciona abandonar o euro? O que é o Syriza quer, afinal, pode ser a grande questão dos próximos tempos. E sempre quero ver como se cumprem aquelas promessas leoninas de aumentar o salário mínimo e repor mais isto e aquilo. O que causa a maior perplexidade e justifica a pergunta: com que dinheiro? Então não estava o país perto da bancarrota, e por isso teve de ser intervencionado? Há uma questão de fundo que convém voltar a colocar. Tenho ouvido por aí gritos de apoio aos gregos, espartilhados e esmagados pela malvada troika. Mas a troika, que eu saiba, só actua em países que demonstram ter mergulhado num precipício económico do qual não conseguem sair sozinhos. Depois impõem regras que, em grande medida, se podem considerar excessivas, quase vexatórias? Sem dúvida, mas é o que acontece quando se chega ao ponto de ter de vir a troika. Mas há um factor que parece esquecido nestas ondas muito bonitas de solidariedade com os povos oprimidos pelo grande capitalismo. Qual é a percentagem de culpa desses povos na equação? Dos gregos, dos espanhóis, dos portugueses? É ou não verdade que sucessivos governos desbarataram ou permitiram que se desbaratasse milhões e milhões? Parece-me, aliás, que era sobretudo esta responsabilidade na própria desgraça que José Rodrigues dos Santos pretendeu realçar nas suas reportagens na Grécia. Com algum excesso de linguagem, exemplos extremos, pecando pela generalização? Talvez. Mas não entendo porque provocou por cá tanta indignação. Excessos à parte, não entender que os gregos (ou os portugueses) são em grande parte responsáveis pelo que lhes acontece, é de ingénuo ou mau analista. E esperar que um jornalista com quase 30 anos de carreira vá para o estrangeiro debitar telexes que lhe ditam de Lisboa é bizarro, para não usar outra palavra.