
Não sou contra a tecnologia. Fico, aliás, fascinado por estar a assistir, em vida, a pequenas e constantes revoluções que na minha infância pareciam ficção científica. Acho que devemos utilizar tudo o que de bom e útil a tecnologia tem para nos oferecer. O que acontece é que sou um nabo, um absoluto info-excluído, que nada percebe de nada, e que estraga qualquer computador em que toca, se aquilo não tiver os programas inteligentes que funcionam sozinhos, e que só nos pedem para clicar na palavra “Seguinte”, até aparecer a palavra “Concluído”. Mas não me fico. Aproveito ao máximo o que posso aproveitar, e não, não suspiro pela minha velha máquina de escrever. Mas uma coisa é gostar, desfrutar, aproveitar, outra é sermos engolidos. Ao ponto de já não sabermos viver sem a tecnologia. Como em tudo na vida, também neste campo há as necessidades reais e as inventadas. E estas últimas são muito mais que as primeiras. Poderia avançar os mais diversos exemplos, sendo o mais grave estarmos a assistir ao nascimento de gerações estupidificadas, que vão perdendo a capacidade de pensar, se tudo o que precisam de saber podem ir ver ao Google. Mas veja-se apenas dois exemplos singelos. Outro dia, jantava num restaurante com a minha mulher. Na mesa mesmo ao lado, outro casal, na casa dos 30 e tais, jantava também, homem e mulher frente a frente, como é normal. Ou era normal. Eles frente a frente estavam, mas nem por uma vez se olharam nos olhos. Cada um concentrado no seu tablet, a clicar, a clicar, a escrever, a ler, a sorrir com umas coisas, a franzir o sobrolho com outras. Isto durou uma hora. Inteira. Nem levantaram os olhos para pedir o prato. Já vi casais em silêncio à mesa, e se calhar já nos aconteceu a todos. Quando há uma qualquer zanga ainda mal resolvida. E foi isso que pensei a início. Mas não. Depressa percebi que estavam bem-dispostos. Mas não um em frente ao outro. Entre a vida real e palpável, ali ao alcance, preferiam estar mergulhados na “rede”. Para mim, inacreditável. Mas cada um sabe da sua vida. O problema, parece-me, é quando chegamos ao ponto de a própria sociedade que nos rodeia começar a indicar-nos que o que aquele casal fazia é que é normal, e não eu estar a conversar olhos nos olhos com a minha mulher. Senão, repare-se no último anúncio, amplamente difundido, de uma marca de telecomunicações. O produto que vendem é apetecível, do ponto de vista financeiro. Ou seja, propõem um novo tarifário que baixa os preços das chamadas aos membros de uma mesma família, se optarem pelo pacote tal e tal, e mais não sei quê. Até aqui, tudo normal. Não tenho nada contra boas oportunidades de poupança. Mas o anúncio televisivo é lamentável. Trata-se de famílias inteiras, nas mais diversas situações, a carimbarem o estilo de vida que vi no tal casal. Seis, sete, oito membros de uma família estão lado a lado, mas ninguém se fala: estão todos a falar ao telemóvel com outro alguém, que não está ali ao lado. Não entendo porque se vende um produto de comunicação glorificando… a falta de comunicação. Daqui a uns anos, quando já não soubermos conversar olhos nos olhos, não se admirem que a sociedade está isto e aquilo.