Eu estava moderadamente preocupado, até ao momento da tomada de posse. Agora, estou francamente preocupado com Donald Trump. Acreditei, ingénuo, que os joguinhos da política ainda são os mesmos, o que, neste caso, equivale a dizer que o que se passa em campanha fica na campanha. Trump foi, como todos sabemos, infelizmente, um tornado de frases idiotas ou simplesmente horríveis, de comportamento infantil e agressivo. Mas todos pensámos que esse tipo de campanha não conseguiria resultados. E como estávamos enganados…Restava-nos crer que assim que venceu as eleições, o que foi uma surpresa até para o próprio, as coisas mudariam, que o discurso e pose se tornariam mais “presidenciáveis”. Mas o discurso da tomada de posse, o momento aguardado em todo o mundo, o momento em que se começa finalmente a tirar as medidas verdadeiras ao líder que lá vem, foi absoluto em duas características, nenhuma recomendável: foi confrangedor e assustador. Confrangedor porque foi das coisitas mais pobres que ouvi em muitas décadas; assustador porque perpetua, e acentua, um carácter agressivo, de dedo em riste, um discurso que tem inúmeras ameaças e nenhuma esperança, foram palavras zangadas, sem um sorriso que nos garanta que está tudo bem. E foi tudo isto com uma pobreza de linguagem de quarta classe. Parecia apenas um bully a ameaçar o resto das crianças no recreio. E este momento, sinceramente, já nem dá para rir. Temos agora verdadeiras razões para preocupação, e é toda uma lógica de mundo em que vivemos que pode estar seriamente ameaçada. Esperemos que o que sempre ouvimos seja verdade, que um presidente dos Estados Unidos não faz simplesmente o que lhe apetece, porque o país não é uma ditadura mas, sim, uma teia, tantas vezes complicada e burocrática, de várias entidades que têm de se entender para que decisões possam ir em frente, sobretudo as mais importantes e transformadoras. Em resumo, esperemos que o próprio sistema americano, que tantas lições de democracia deu ao mundo, trate de travar os ímpetos perigosos do novo Presidente.
Entretanto, nestes dias em que esta foi a grande notícia, tantas outras pequenas notícias passaram ainda mais despercebidas do que o costume. Um estudo recente apresentou estatísticas de terror social em Portugal: todos os dias, um qualquer filho agride o pai ou a mãe, ou ambos. Já tínhamos tido noção de casos, um aqui, outro acolá, que pareciam ser fenómeno isolado, mas esta compilação de números mostra a terrível realidade, uma realidade de epidemia trágica, que se vem juntar à mais conhecida face da violência doméstica, aquela que faz com que, quase numa base diária, um homem mate a mulher, ou ex-mulher. Ficámos, pois, a saber que os casos de violência sobre idosos, perpetrados pelos próprios filhos, são da mesma dimensão. Se a isto juntarmos os casos crescentes de violência no namoro, que são apenas o despertar jovem de futuros assassinos machistas, temos um angustiante mapa de terror, que nos mostra que grande parte da população vive no medo e sob ameaça de familiares. Sem desprimor para outros dramas, o terror violento dentro de casa é para mim das situações mais abjectas e aterradoras. A sociedade, com o Governo à cabeça, tem de encontrar saída para isto, ou pelo menos mecanismos de vigilância mais eficazes, e, sobretudo, formas de punição mais rápidas e penalizadoras. Mas para isso é necessária a consciencialização de que isto é um drama. E não vamos lá enquanto houver decisões como as do juiz que recolocou um agressor e uma vítima a continuarem a viver juntos na mesma casa. É não ter a mínima noção do que se julga. E isso também é assustador, as vítimas perceberem que é assim que terminam as queixas que apresentam.