Depois de muitas personagens que arrancaram gargalhadas aos portugueses, Marina Mota vai agora surpreender na pele de uma terrível vilã. A primeira que interpreta nos seus quase 50 anos de carreira artística. Na próxima novela da TVI “Para Sempre” (que está a ser gravada há sete meses e deverá estrear em setembro no lugar de “Amar Demais”), a veterana atriz será uma mulher fria, calculista, com poucos escrúpulos e que abandona um filho (personagem de Diogo Morgado) ainda em criança. E nas ruas é bem provável que lhe digam que a sua personagem “é uma cabra”. É que vai impossível não odiarmos a Antónia Novais.
Quem é a terrível Antónia?
Terrível porquê? (risos) Logo nos primeiros episódios haverão muitas revelações. Ela é uma empresária, dona de um grupo, o Braga Saúde, que herdou do marido. É viúva há mais de uma década. Tem dois filhos, o Lourenço (Pedro Sousa), e a mais nova, Joana (Sílvia Chiola). Vive com a mãe, Natália (Carmem Santos). Às vezes parecem uma família disfuncional. O que vai parecer ao espectador – e logo veremos se ela é mesmo assim ou não – é que a Antónia é uma mulher fria, calculista, com poucos escrúpulos, que faz tudo para atingir determinado estatuto social. Agora, se é só isso ou não, têm de ver para saber.
Ela é uma mulher que abandonou um filho em criança…
Sim… O Pedro (Diogo Morgado), quando ele tinha 4 anos. Com o tempo, o público vai perceber o porquê. Digamos que há mais do que uma razão para isso ter acontecido.

Como foi criar esta vilã?
Já me cruzei com muita gente, já vi muita coisa, já observei muito. E, pelo menos para mim, existem muitas ‘gavetinhas’ onde armazeno alguma informação que sei que mais tarde vai ser-me útil para fazer determinada personagem. E gosto de pedir ajuda aos autores para me explicarem qual é o passado daquela pessoa. Para depois poder criá-la à minha maneira. Mesmo que não seja relevante para a história ou que o espectador nunca venha a saber. Se ela tem habilitações literárias, que tipo de música ouve, se algum desgosto de amor a deixou pior, se ela já é geneticamente má… Há muitas coisas que preciso saber para construir uma personagem. Depois, preciso de acreditar nela. E defendo-a com unhas e dentes, até ao fim, como se fosse a melhor pessoa do mundo. Mesmo com os defeitos que ela tem, mas isso temos todos.
Ao longo dos anos, o público tem-na visto mais em registos cómicos. Tem receio que este papel mais denso cause estranheza?
Sou antirrótulos! Um ator e uma atriz são atores, independentemente da personagem que estão a vestir. As pessoas viram-me mais vezes num registo mais de comédia ou mais boazinha. Mas um ator tem de ser muito mais do que isso. Não tenho medo absolutamente nenhum que estranhem ver-me neste registo. As pessoas também estavam muito habituadas a ver-me fazer só humor, até, pela primeira vez, me verem fazer uma personagem mais séria e quase dramática. E, se calhar, aí perceberam que eu não faço só rir. No teatro de revista acontece isso. Quando a produção é minha, faço sempre questão de trazer ao palco número, e até de uma forma pedagógica, números de intervenção de cidadania. E logo aí já é um registo muito diferente do que quando estou a fazer comédia. Não me limito a fazer um registo só. Agora, na novela, o que irei provocar no espectador, isso para mim já é surpresa.
“Vou defender a Antónia até ao fim”
(Marina Mota)
Está pronta para, pela primeira vez, ser odiada na rua?
Uma coisa é dizerem-me na rua: ‘Aquela Antónia é um cabra’. Ou dizerem: ‘Marina, odeio a sua personagem’. Vou achar isso ótimo! Outra será dizerem que me odeiam a mim. Eu deixo a Antónia no estúdio, não a trago comigo. Espero que as pessoas se sintam afrontadas quando virem a Antónia na TV, mas que saibam fazer a distinção de que aquela não sou eu (risos). Em algumas situações vão odiá-las. Em outras, até eu me divirto com ela. É uma mulher sarcástica, com um sentido de humor que me agrada. Tem algumas tiradas com graça. Mas é uma personagem pesada. Acho a Antónia interessante pelas diferentes camadas que ela tem. Não é só má, só fria, só despreocupada. Mesmo quando ela faz coisas erradas, perceberão que não as faz de ânimo leve”.
Há semelhanças entre a Marina e a Antónia?
Acho que todos temos um bocadinho de tudo dentro de nós. Não somos só bons ou só maus. Talvez eu e a Antónia tenhamos em comum uma forma mais ou menos parecida de lidar com o universo masculino. Ou seja, ela é uma mulher que não tem problema absolutamente nenhum em estar à altura, ou acima, de um género que não é o dela. Ela não é uma mulher submissa. E isso eu também não sou! Nem se sente diminuída quando está a falar com um homem de poder, por exemplo. Aí, acho que as duas nos assemelhamos.
“Ela tem limites… Mas não se sabe bem quais”
(Marina Mota)
Em março vai celebrar 50 anos de carreira. Qual é o balanço?
Não parece que passaram 50 anos. Sou de facto uma privilegiada por, ao fim deste tempo, continuar a trabalhar ativamente, sem nunca ter tido uma pausa, a não ser quando me obrigo a ter. Isto prova, pelo menos para mim, que o objetivo não é chegar lá. É mantermo-nos lá! E eu cá estou… Até sentir-me útil, até perceber que o público me quer ver, até eu conseguir dar o meu melhor a essa entidade máxima que merece todo o meu respeito. O balanço é muito positivo! Estou sempre a querer fazer coisas novas, nunca estou muito satisfeita com o que estou a fazer no momento. Ainda há muitas coisas diferentes que quero fazer.
Continua a sentir muito carinho por parte do público?
Quando estou com um espetáculo itinerante na estrada, ou até a passear pelo meu País, sinto o carinho com que as pessoas me abordam. E o que mais me traz orgulho – não é vaidade – é perceber que tenho pessoas a quererem dar-me um abraço, dos 15 aos 80 anos. Umas que seguem a minha carreira e a minha vida e continuam comigo. E outras, que não tendo idade para ver-me quando eu fazia TV com regularidade, não sei como nem porquê, fizeram uma busca ao meu trabalho e conhecem coisas que eu fiz há muitos anos. Continuo a achar incrível, quando estou em teatro, ter à minha frente um público tão eclético, de todas as faixas etárias e classes sociais. E tenho o privilégio de sempre ter sido assim.
De volta à estrada com uma comédia

“É Tudo o Morto Levou” é a comédia protagonizada por Marina Mota que, a partir de 13 de novembro, regressa aos palcos, de norte a sul do País. A pandemia só permitiu realizar quatro sessões em 2020. “Quero acreditar que as pessoas além de querem ir ver a peça, financeiramente, também podem ir. Porque este ano e meio de pandemia – quase dois – deu cabo da vida de muita gente”, afirma a atriz, acrescentando: “Cálculo que, depois destes tempos tão cinzentos, o público queira voltar a rir. E é isso que vamos tentar que aconteça. Quero continuar a descentralizar o teatro, mesmo com poucos apoios, correndo todos os riscos”. Após uma personagem tão intensa na novela “Para Sempre” (as gravações terminam em setembro), a artista vai agora recriar algumas das suas personagens cómicas mais emblemáticas que popularizou na televisão, como a “desbocada” Matilde ou o insubordinado Bisnaga. “Não sei viver sem as tábuas. Sou de teatro, não há nada a fazer. É a minha base, a minha escola e faz-me falta”. A enorme versatilidade de Marina Mota estará agora mais visível do que nunca! “Na TVI vão ver uma atriz a fazer uma personagem muito pesada e densa. E se forem ver a mesma atriz ao teatro mais próximo da sua localidade, vão vê-la fazer algo completamente diferente. O convite está feito!”. A primeira sessão acontece em novembro em Alverca.
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