
Foram muitos os meses em que viveu no seu segundo país, já que Joana de Verona, 30 anos, é luso-brasileira, nascida no Maranhão, mas chegou a altura de regressar. A pandemia que assola o mundo e o final das gravações da novela brasileira “Éramos Seis” assim a obrigaram. É, no entanto, com carinho que fala da sua Adelaide, mulher destemida até ao final da trama, e da sua experiência a viver no Arpoador, zona do Rio de Janeiro que lhe trouxe as maiores recordações.
Em quarentena, tem aproveitado para rever e ver filmes, trabalhos de dança, ler, pintar, trabalhar na criação
do espetáculo “Mappa Mundi” e espreitar “Éramos Seis”.
De que forma chegou à novela?
Através de um convite da diretora de casting. Por acaso, já estava no Brasil, na Bahia, e fui ao Rio fazer essa pesquisa, que era uma espécie de audição.
Esta foi a primeira novela que fez na TV Globo. Gostou? Que diferenças sentiu em relação a Portugal?
Tinha feito uma brevíssima participação, quando era miúda, na série “Presença de Anita”, mas em adulta e à séria, sim, foi o primeiro trabalho no canal. Gostei muito, pelo belíssimo núcleo de atores, pela história, pela harmonia, pela dedicação e, porque, efetivamente é um trabalho de grande qualidade técnica nos vários aspetos. São episódios de 35 minutos nos quais existe uma lógica mais cinematográfica. A maior diferença é a dimensão. É, de facto, uma indústria. Creio que são 15 mil pessoas que trabalham ali. Encanta-me o trabalho dos carpinteiros, construtores e cenógrafos das magníficas cidades cenográficas.
Foi bom viver no Rio de Janeiro?
Já vivi no Rio algumas vezes, na infância e adolescência, onde estudei e fiz cursos de dança e teatro, em 2016, nas filmagens do filme “Praça Paris”, durante a série “Santos Dumont” e em vários outros momentos mais breves. É uma cidade onde vou bastante, onde tenho família, amigos e memórias. Neste momento, tenebroso politicamente, o Rio está a ser maltratado pelos governadores, que nada fazem para além de destruir a cidade e a população com medidas impensáveis. Fora isso, e a imensa discrepância social, que é dos problemas dramáticos da realidade brasileira, é uma cidade que adoro sim. A força da natureza é imperativa nela.
Escolheu que zona para viver durante o tempo em que lá esteve?
O Arpoador, junto da minha antiga escola, onde estudei no 7o ano, e da escola de teatro Laura Alvim. Foi bom, por ser um lugar familiar.
Quais eram as suas rotinas?
Além do ritmo intenso das filmagens, nadava e dançava numa escola de dança. Quando havia tempo, ia ao cinema, a concertos, ao teatro.
De que sentiu falta?
Da minha mãe, pois antes de “Éramos Seis”, estive dois meses a morar em São Paulo, a fazer a longa-metragem “Tinnitus”, que irá estrear este ano, e após isso estive na Grécia e Turquia. Felizmente, a minha mãe veio visitar-me e foi muito bom estarmos as duas juntas neste contexto.
Como foi a reação do público brasileiro ao seu trabalho?
Positiva e participativa. Muitas mulheres de 70 anos, e jovens também, paravam-me na rua e falavam com carinho, admiração pela força da personagem. A Adelaide era importante para elas, ou porque gostavam de ser assim, ou porque se lembram de um tempo das suas vidas em que também quebraram convenções. É muito especial perceber que uma personagem toca o público.
Como foi gravar o final, apressado pelo disseminar do coronavírus?
Apressado e emocionante. Queríamos terminar de contar esta obra, estávamos a três dias do fim das filmagens e anteciparam o final. Gravámos por blocos, para não haver aglomerações, e alguns atores mais velhos foram retirados das filmagens.
De que forma deixou o Rio de Janeiro? O que sentiu?
Deixei o Rio à pressa, antecipei a viagem com receio dos voos serem cancelados. Senti-me a fugir de um país que iria entrar em “guerra” para vir para outro, já muito afetado. É um momento delicado. Temos de ter responsabilidade social e fazer com que o sistema de saúde não colapse, protegendo-nos a nós e aos outros. Esperar que a ciência encontre solução. Já basta as pessoas desabrigadas, que não tem condições de se alimentarem e de terem um lugar para ficarem seguras… Isso sim, é dramático!