Não sei se é da idade, da falta de pachorra, ou de ambas, que até costumam andar de mãos dadas. Mas parece-me que a publicidade nacional atravessa uma fase pobrezinha. Em televisão, rádio ou imprensa, é raro o momento, a frase, a imagem, ou a interpretação, que nos fique na memória, que nos faça repeti-la sem dar por isso, ou comentar com os mais próximos "já viste aquele anúncio?" Todas as grandes campanhas que fazem parte do nosso imaginário deixaram rasto, e parece-me que todas tinham um ponto em comum: uma brutal simplicidade de mensagem e processos. Muitas das ideias luminosas que fizeram andar o mundo deixaram uma sensação (só sensação…) de facilidade. A impressão de que também poderíamos ter pensado no mesmo, que aquilo esteve sempre debaixo do nosso nariz. E estava. Mas os que vêem isso primeiro são os que se destacam. A ideia de facilidade não faz desmerecer; muito pelo contrário.
Quantas vezes não nos aconteceu, ao ver um qualquer desportista genial, comentar que "aquilo parece fácil". Pois. Parece. Por isso é que ele é genial e nós não. Ora, assumindo toda a subjectividade que a declaração encerra, os últimos tempos têm sido parcos em "acontecimentos" publicitários. Pouco, ou nada, fica no ouvido ou na memória. Pouco, ou nada, faz sorrir ou reflectir. Refiro, como excepção, o piscar de olho bem-disposto, ainda que brejeiro, do "melhor pacote do Verão", do Sapo. Ou a explicação possível para a longevidade dos Mercedes: um "cientista" diz que pode ser da "junção espaço-tempo segundo a lei de não sei-quê"…ou então porque os carros são muito bons.
Tão simples e directo como isto. Que é, afinal, a ideia que quase toda a publicidade quer deixar, mas gasta entretanto uma insuportável porção de latim. Veja-se os anúncios dos pensos higiénicos, cheios de florzinhas, nuvens, cores e musiquinhas…quando todos sabemos o que querem dizer. E é este insuportável ruído de fundo, da imensa quantidade de empresas, produtos e serviços que já não sabem o que hão-de dizer ou como se reinventar, que me dá nos nervos. A Coca-Cola, justiça lhe seja feita, já resolveu o problema há muitos anos. Sendo já desnecessário louvar o produto, explicar para que serve, ou perder tempo a denegrir a concorrência, vai refrescando de ano para ano com montagens à música. Fica o essencial: a Coca-Cola limita-se a dizer que continua por aí no mercado, e que quem a consome ama energicamente a vida. Por cá, são os operadores de telemóveis que enfrentam o dilema de já não terem muito o que dizer. Vai daí, falam que se desunham, à bom português. São todos iguais, tirando umas borlas sazonais nos tarifários. Anúncios estilosos mas vazios, com cara de coisa que custou uns milhares, onde, inevitavelmente, gente bem-disposta e jovem se multiplica nas mais banais montagens, servidos pelos mais básicos dos textos: aqueles que querem dizer tanta coisa que não se focam em nada. E lá vem a lengalenga que nos informa que quem usa aquele operador é gente que vive num turbilhão muito moderno, gente que vive a mil, num carrossel de emoções, e lá vêm as referências aos sorrisos, às saudades, às lágrimas, às reconciliações, decepções e esperanças, aos afectos, aos amores e desamores e aos que fazem as pazes outra vez, viva os gordos e os magros, os bonitos e os que fazem por isso, os novos e os menos novos, que são também uns porreiraços e até aprenderam a compreender, aceitar e conviver com as novas gerações, e com eles partilham sorrisos, alegrias, reviravoltas, lágrimas, e mais um tortuoso mapa de afectos, e blá blá blá. Cansado? Também eu. E falta dizer que a ilustrar o mesmo tipo de texto em círculo lá estão as mesmas imagens de catálogo de moda, as câmaras-lentas, a musiquinha. Mas é o que dizia: devo ser eu que ando com falta de pachorra. E preferiria que me dissessem: anda cá comprar o telemóvel, que a coisa funciona bem, tem garantia e até nem é cara. Sou eu que não me adapto à moda dos que me enchem os ouvidos de palavras e palavras e não têm realmente nada para dizer.