1.Os anos que passam, que equivalem a experiência de vida mais a profissão que escolhi, ensinam, dia a dia, que já vimos praticamente tudo. Ainda assim, o horror arranja maneira de nos surpreender. Não há como ficar indiferente, mesmo que seja por defesa emocional, a crime tão hediondo quanto a morte deliberada, pensada e anunciada, de um bebé de meses. Aconteceu, na semana passada e, sem surpresa, tem raiz num quadro da chamada violência doméstica. Essa praga de violência sem fim e, ao que vemos, sem limite para a maldade descontrolada. Primeiro o choque: um homem foi capaz de pegar numa faca e assassinar o próprio bebé. Claro que, quando se começam a escavar pormenores, se percebe que a fonte da barbaridade está na relação homem-mulher. Mais uma história em que ela não aguenta mais um historial de violência e avisa que vai deixá-lo. E, perante isto, ele faz isto. É um novo tipo de horror. Em vez de matar a mulher, condena-a a uma vida de sofrimento e trauma. Obriga-a, para sempre, a chorar todos os dias ao imaginar o bebé com a faca no peito. É de uma enormidade tal que já não há palavras para falar disto. Como já não há lei que aguente este estado de barbárie. Os 25 anos de pena máxima são já pequenos para tanta selvajaria. E convinha que os legisladores começassem rapidamente a pensar nisso. Bem sei que vivemos numa democracia politicamente correcta, cheia de sensibilidades ditas humanistas, que se apressam a dizer que penas mais pesadas não resolvem. Pois. O que eu acho é que por exclusão de partes as nossas penas não estão a resolver. Experimentem lá penas de 50 anos ou prisão perpétua a ver se os crimes diminuem ou não. É só uma sugestão. Mas não se vai passar nada, pois não? Enquanto não morrer o bebé de uma personalidade com poder no País, ninguém vai mexer em nada.
2. Mas há mais variantes do horror que ainda conseguem surpreender, agora mais uma nesse filão nojento e inesgotável dos maus tratos a animais. Maus tratos, não. A palavra é assassínio de animais inocentes. O cão foi resgatado, mas a verdade é que alguém o atirou por um penhasco. Com um bloco de cimento amarrado ao pescoço, naturalmente para garantir que não se conseguiria mexer mais, para se afogar quando aterrasse na água. Deixe-me repetir, para ver se eu próprio acredito no que estou a contar. Um cão atirado de um penhasco com um bloco de cimento amarrado ao pescoço. Um casal que passeava por ali, com outro cão, deu pelo infeliz e chamou os bombeiros a tempo de o salvarem. Que se passa? Que é isto? De onde vêm estas barbaridades, este nível de frieza e maldade? Sobre crianças de meses, sobre animais? Há qualquer coisa de profundamente errado e perigoso por aí à solta. Começa a haver um fosso demasiado grande entre os crimes que são praticados e as penas que os criminosos enfrentam. E a lei, representada de venda nos olhos, deveria também colocar uns tampões nos ouvidos quando alguém fizer a primeira tentativa de “explicar” porque faz alguém coisas destas. Veja-se, aliás, que algumas televisões não tardaram a convidar os psicólogos do costume. Que disseram coisas tão esclarecedoras como “sabe, é muito difícil dizer o que passa pela cabeça de um homem que mata o seu filho à facada”. Talvez seja. Enquanto pensamos no assunto, prenda-se para sempre.