Depois de a TvMais ter noticiado em primeira mão que Cândida Baptista, 3a classificada na temporada inaugural de “Hell’s Kitchen”, ia levar Ljubomir Stanisic à barra do tribunal, eis que a ex-concorrente decidiu abrir o seu coração para falar deste assunto que ainda hoje a perturba e a deixa visivelmente incomodada. Os factos remontam aos meses de dezembro de 2020 e janeiro de 2021, período em que decorreram as gravações do programa produzido pela Shine Iberia e transmitido no horário nobre da SIC, a partir de março de 2021. Sobre o processo em si, Cândida dá-nos os pormenores daquilo que está autorizada a revelar. “Este é um processo sobre o tratamento que eu tive dentro do programa. Fui assediada pelo chef Ljubomir e isso foi óbvio”, começa por explicar. A ex-concorrente recorda os meses de sofrimento em que teve de conviver diariamente com Ljubomir Stanisic. “Dá-me nojo tudo o que aconteceu, a situação inteira… Nem consegui assistir ao programa. Não tirei proveito das entrevistas, fotos, eventos, porque dá-me um embrulho no estômago só de pensar. Cada vítima tem um jeito de lidar com isso e eu preferi nem ver nada. Só vi o da semifinal, não consegui ver mais nenhum”, lamenta.
Cândida alerta para o facto de não ter sido a única a sentir-se incomodada com o alegado “comportamento inapropriado” do anfitrião do concurso. “Como foi divulgado, até por vocês, outras pessoas reclamaram. Vários telespectadores sentiram-se incomodados. Foram 13 as denúncias à ERC [Entidade Reguladora para a Comunicação Social] sobre esse assunto”, afirma, sublinhando: “E do que eu vivi, nem tudo foi para o ar. Se algumas coisas que passaram no programa deixaram as pessoas chocadas ao ponto de fazerem uma reclamação, imaginem o que é que pode ter acontecido e que não viram. O processo é sobre isso mesmo, o que aconteceu nos bastidores que é bem mais do que as pessoas conseguiram ver em casa”. Além dos espectadores, houve concorrentes que, alegadamente, também se terão sentido melindradas com determinadas atitudes do chef. “Duas pessoas que também participaram no programa entraram em contacto comigo para dizer que aconteceu o mesmo, que era exatamente assim que elas se sentiam”, contou. Cândida sabe que contra Ljubomir “há um caso de assédio sexual e que nele já há um processo em andamento”, além do que ela própria interpôs. A ex-concorrente sentiu-se, de certa forma, aliviada por existirem outras queixas contra o anfitrião do programa. “As pessoas viram. É bom saber que quem estava em casa a assistir ao programa conseguiu perceber e que o que aconteceu até foi bem visível”, diz. Questionada pela TvMais se o assédio de que acusa Ljubomir é de cariz sexual e se alguma vez houve contacto físico ou tentativa por parte do chefe de cozinha, Cândida afirma que contará tudo em sede própria. “Isso são coisas que fazem parte do processo e só posso falar sobre isso na justiça”, adianta.
A ex-concorrente brasileira, que vive na Áustria, explicou que desde que o seu processo contra Stanisic se tornou público tem sofrido acusações e ofensas nas redes sociais. “Recebi muitas mensagens de várias pessoas dizendo: ‘Veio fazer o quê então, brasileira?, ‘Porque não volta para a tua terra?’, ‘Tinha de ser brasileira!’ Esse tipo de coisas. As pessoas falam do que não sabem. O processo não começou a semana passada só porque foi noticiado na altura. Não queria falar sobre ele, mas já que se tornou público, mesmo não tendo sido por mim, vamos falar sobre isso. E tudo começa assim, primeiro ninguém quer acreditar, mas as vítimas vão aparecendo e eu espero que apareçam mais”, frisa. Por ter ficado profundamente incomodada com tudo o que, alegadamente, vivenciou, Cândida decidiu deixar o caso inteiramente ao cuidado do seu representante legal. “Nem quis ler os autos do processo, é assim que lido com isso. Sobre a indemnização, o meu advogado explicou que se faz um pedido, se tenta um acordo e que se não chegarmos a acordo partimos para a justiça. Deixei tudo nas mãos dele”, diz, explicando que não é o dinheiro, neste caso uma indemnização de 40 mil euros, que a move. “O que importa aqui não é o dinheiro. Aliás, se me calar e fizer qualquer acordo financeiro, isso só beneficia o meu agressor. Quando se fala no assunto outras vítimas das mesmas situações conseguem perceber que existe lei, que existem pessoas que têm interesse em que ela seja cumprida. Que nós, mulheres, temos direito a chegar ao nosso ambiente de trabalho e não sermos assediadas e julgadas porque tivemos um homem ou 50 ou andamos nuas ou vestidas… Mulher não tem de ser tratada como mercadoria, objeto ou como se fosse de acesso fácil.” A ex-concorrente quer que o seu caso seja um alerta e ajude outras vítimas a denunciar os seus agressores. “O importante é que as pessoas entendam que em ambiente de trabalho todos têm de ser respeitados. Não deve acontecer em lugar nenhum a pessoa usar da sua posição superior para fazer exigências, para fazer piadas que não são nem um pouco engraçadas. É muito injusto para qualquer um. Acho importante que as pessoas percebam que isso não deve ser feito, que medidas judiciais devem ser tomadas. E não só deve ser feito como é um crime”, diz, acrescentando: “Não é porque é que estou nua num estúdio ou estou nua a preparar o café da manhã para o meu marido que mereço menos respeito do que uma senhora que anda mais recatada e toda vestida. A pessoa não pode ser julgada pelo que ela veste ou não veste. Dizer que brasileira é tudo p*** não é correto, e é crime!”.
Cândida tem a certeza de que aquilo que vivenciou nas gravações condicionou a sua prestação e só conseguiu respirar de alívio no último dia. “Obviamente que a Francisca e o Lucas [1a e 2o classificados no programa] são cozinheiros excelentes, ia ser uma briga bem difícil. Mas tudo o que sofri influenciou muito a minha prestação, o meu desempenho. Não queria estar ali, estava extremamente desconfortável. O meu melhor momento foi quando senti o alívio de saber que era o meu último dia. Já estava em 3o lugar, e até falei para um colega meu: ‘Agora f***-se, ele [Ljubomir Stanisic] vai fazer o quê? Vai-me mandar embora?’ Estranhamente foi o dia que menos teve interação comigo”, sublinha. A ex-concorrente dá a entender que, caso se avance para julgamento, poderão existir várias provas comprometedoras para o chef. “Tudo aconteceu num estúdio de televisão. Existem áudios, imagens, alguém com o telefone na mão que fez um vídeo, tem gente que pode falar sobre isso…”, deixa no ar.
Apesar de também a produtora do programa ser ré neste caso, as acusações de Cândida são unicamente em relação ao anfitrião. “O processo é contra ele e contra a produtora, porque eles são os meus empregadores, mas a produção é maravilhosa. O assédio é só da parte do chef Ljubomir. A situação aconteceu em frente de toda a gente. Houve falas totalmente inapropriadas, ao ponto de, no final, os participantes virem ter comigo a dizer que sentiam muito e que não era normal ele falar comigo daquele jeito”, conta. Desde que o programa terminou, Cândida Baptista não voltou a ter qualquer contacto com o chef e espera que a sua ação contra ele inspire outras vítimas. “Não sei qual será a punição, mas só não ter a chance de agir assim novamente já ajuda muito. Permitir que isso aconteça de novo, quem se cala, quem não quer falar do assunto, também faz parte do problema”, esclarece.
Contactado pela TvMais, Ljubomir Stanisic disse que não tinha qualquer comentário a fazer sobre este assunto. Já da produtora Shine Iberia não obtivemos qualquer resposta.