Berlusconi comporta-se como um menino mimado que pode tudo, e que a cada passo que lhe criticam, inventa um novo, do mesmo calibre. A colecção de candidatas que fez desfilar nas regionais italianas é a prova mais viva e palpável de um gozo pegado com as instituições, os adversários, os inimigos, os eleitores, e até com a própria família, a quem pediu mil vezes desculpa, para voltar ao mesmo vezes sem conta. Gozar é a palavra mais adequada, já que Berlusconi goza à farta o poder que tem, gozando com os outros no exercício. É cada vez mais difícil catalogar as notícias que temos de dar sobre ele. São do capítulo do Internacional ou do fait-divers? São para acoplar a outros factos da política mundial, ou para tratar com mais leveza, ao lado de outras historietas bem-dispostas ou humorísticas? Uma coisa parece certa, e Berlusconi quer que o mundo saiba disso: ele não mudará. Ou lhe retiram o poder nas urnas, ou não haverá poder judicial, moral ou social capaz de o travar. Nem ele está interessado nisso. Latino tradicional, mostra-se mil vezes arrependido, de lágrimas nos olhos, sabendo que voltará ao mesmo na primeira ocasião, para pedir desculpa outra vez. Berlusconi já não está no poder para fazer seja o que for. Está no poder para experimentar até onde pode ir, até onde o deixam ir. Escolheu como candidatas um grupo de mulheres que não pesca patavina de política, que não teve uma única experiência de vida que a aproximasse sequer de uma capacidade potencial mínima para um cargo, que em comum têm o facto de serem esculturais, vistosas, e candidatas a passar pela sua cama. É isto e não mais do que isto. Mas acho que, e voltado ao início, entre a indignação e o sorriso, não será difícil de adivinhar que Berlusconi volte a ganhar. O que isso diz da sociedade italiana, ou de outras onde nenhum escândalo faz mossa, já é matéria para outras análises.
2- No futebol português, nenhum clube vence verdadeiramente um campeonato. Há sempre um bastidor, um túnel, um esquema, que muda às vezes de cor, mas que mantém sempre uma mesma missão: desvalorizar a vitória do campeão, e encomendar para si a faixa do vencedor moral. Nos últimos anos, enquanto o FC Porto ia somando títulos, uns mais difíceis que outros, era ouvir os benfiquistas gritarem contra o "sistema", palavra de código nacional para dizer que o Porto compra os árbitros todos e por isso vence. Sim, todos, e todos os anos, pelos vistos, segundo ouvi a muito benfiquista enxofrado. Pode o Porto jogar bem, demonstra inequívoca superioridade, que haverá sempre quem se concentre num determinado lance que deveria ter sido penalti e o árbitro não assinalou, naquele golo em pretenso fora-de-jogo, naquela expulsão cirúrgica de um jogador adversário, et,etc. É sempre o sistema, é sempre uma roubalheira. Lógica simples: se não ganho campeonato, mancho a vitória do outro. E eis que este campeonato, a moeda troca de face. Eis que agora foi o Porto a descobrir uma forma de manchar a caminhada triunfal do Benfica.
Ai se o Hulk não estivesse tanto tempo sem jogar…Derrotado e abatido sem espaço para dúvidas em tanto jogo, o Porto encontrou a sua vitória moral, com a qual vai procurar menorizar o adversário durante muito tempo. Ai se o Hulk tivesse jogado os jogos todos…Sendo argumentação de mau perdedor, não deixa de ser verdade o direito à indignação portista, ou de qualquer outro clube que tivesse passado pelo absurdo de ver uma decisão tão grave passar do oito para o oitenta. Mas, convenhamos, não explica um campeonato.