1 – O caminho, previsível, para eleições antecipadas, faz-se na certeza de que o PSD vence à vontade. Já anda no ar a melodia da mudança de governo, da passagem de testemunho, e o próprio Passos Coelho não tem resistido a declarações de chefe do governo: para ele, é uma questão de algumas semanas. É compreensível, basta ouvir o vento que sopra. Mas é certo? Aqui, já tenho as minhas dúvidas. Que começam, precisamente, sobre o verdadeiro motor que precipitou as eleições antecipadas. Ouviu-se, demasiado cedo, que vêm aí as eleições porque a oposição finalmente encostou Sócrates às cordas. Ele, o terrível inflexível, agarrado ao poder, não tem outra saída senão reconhecer que já não tem condições para continuar. Pois. Pode bem ser. Mas não poderá ser também que ele, a ver mais além, tenha escolhido o momento que mais jeito lhe dá, sabendo que o vento económico vai soprar forte, num assobio insuportável, e talvez, talvez, seja bom que fique o PSD com as culpas desse vendaval de que ninguém se livrará? Basta ouvir a repetição do estribilho socialista, antes e depois de entregarem as chaves do país ao Presidente da República. Vejam como o PSD é irresponsável, quer precipitar eleições num momento destes. E depois de a coisa se dar, vejam como o PSD é desonesto, ainda nem chegou ao poder e já anuncia novos sacrifícios para os portugueses, malvados. (A ideia, óbvia, é fazer a partir de agora figura de ausente, como se Sócrates não tivesse nada, ou quase nada, a ver com o estado a que isto chegou). Esta é, de resto, a eterna encruzilhada da política portuguesa que mantém reféns os cidadãos. Cada partido que chega ao poder, PS ou PSD, começa logo por avisar que terá de tomar medidas difíceis devido ao pântano em que o adversário deixou o país. É por isso que dá jeito a Sócrates, e qualquer aprendiz de assessor o percebe, entrar no jogo de Passos Coelho e trata-lo já como se o PSD já tivesse de facto, reconquistado do poder: fica lá tu com as responsabilidades. A questão é que Sócrates o faz, desta vez, antes das eleições, o que pode vir a baralhar os dados, e confundir tanto os portugueses, que já nem sabem bem quem devem varrer de S.Bento: se os que verdadeiramente lá estão, ou aqueles que, não estando, se comportam como se estivessem. Sócrates ferido pode dar ainda uma grande armadilha para o PSD, a quem não aconselharia a encomendar já as faixas de vencedor com maioria absoluta.
2- Os sportinguistas, aqueles que se limitam a amar o clube, andam duplamente tristes, e agora, envergonhados. Não só a equipa anda como anda, como as eleições foram sendo (e terminaram em conformidade) um espectáculo constrangedor. Os ataques entre candidatos, em "milhares" de debates, foram crescendo de tom, e chegaram a roçar o ordinário. Mas penso que nada nos preparava para aquela noite eleitoral. Bruno de Carvalho, a reboque de sondagens e inflamadas intervenções, dava como fechada uma luta que ainda não se fizera. A longa noite de votos ajudou esta percepção: eleições são como jogos de futebol: enquanto o árbitro não apita o fim, tudo pode acontecer. E aconteceu. Apesar do crescendo de "informações" sobre a "vantagem de Bruno de Carvalho, o "tudo indica que Carvalho é o novo presidente", "Carvalho lidera com à-vontade", afinal havia outro. E agora que o clube procurava a paz, mantém-se o caldo entornado, e cada vez mais quente. Bruno de Carvalho quer novas eleições. Ora, não houve, naquela noite, nenhum toque de alerta que nos pudesse fazer pensar que havia marosca no ar, e que as eleições deviam ter polícia das Nações Unidas, como se fossem uma esperada e singela fraude de ditador africano. Nada disso. Apenas ouvi que se ia procedendo à contagem dos votos. Até que, contra todas as "tendências", se chegou ao apito final. Bruno de Carvalho terá as suas razões para tentar repetir tudo, ou ganhar na secretaria, mas espero bem, para a imagem do futebol nacional e da nossas costela democrática, que tenha na manga argumentos mais sólidos do que um amuo desiludido de quem achava que ia ganhar, e afinal perdeu. E que, a bem do desporto nacional, o Sporting encontre, seja com quem for, aquilo que um ex-treinador tornou célebre ao ponto de ser gozado pela expressão: uma tranquilidade.