1 – Não sei se Sónia Brazão procurava o suicídio. Não a conheço, muito menos os seus estados de alma ou ideias de destino. Mas sei, porque tenho lido, como todos os portugueses, que a história da explosão ainda não está cabalmente explicada. Dou de barato as primeiras teorias que já falavam de suicídio horas depois de ela entrar no hospital. Entendo a tendência humana de apimentar os dramas. Por isso não fui convencido, desde logo, pelos testemunhos pungentes de “colegas e amigos”, que me falavam da sua tendência para a depressão, da tristeza recente de se ver excluída do mundo de estrelato com que sempre sonhou. Eu, relatos que me afiançam “eu já estava a ver no que isto ia dar”, aprendi a relativizá-los. Dou pouco crédito a quem sabe de tudo depois de as coisas acontecerem. É como “os peritos” em televisão que têm muitas certezas sobre estratégias no dia seguinte, depois de verem as audiências. Mas depois, desprezados os habituais primeiros ecos dramatúrgicos, em que meio mundo do show business se coloca em bicos de pés e desata a fazer declarações, à boleia da desgraça do colega (o mesmo aconteceu com Angélico), eis que surgem indícios a que dou mais crédito. Foi feita, ou estará em curso, uma investigação ao local, para ver se bate a bota com a perdigota. Ou seja, se o testemunho de Sónia condiz com os vestígios deixados pela explosão. E é esta investigação que me diz (leio agora) que provavelmente sim, a rapariga procurava mesmo o suicídio, ou, no mínimo, uma chamada de atenção (com gás, a chamada de atenção costuma ser eficaz, e a última…) Ora, reforçando a primeira frase desta crónica, as duas alternativas mantêm–se ainda de pé: ainda não estou convencido de que Brazão tenha sido uma vítima inocente de um percalço que não previu. Posto isto, a minha conclusão é toda no condicional: não tenho certezas, e até pode bem ser verdade o que ela diz. Mas se (e este “se” é importante) queria matar-se, o método escolhido é não só disparatado como revela uma falta de consciência humana fora do comum. Basta referir que a explosão só não matou alguém por bondoso capricho do destino. Um suicídio é um desespero, e ninguém estará em condições de julgar o que passa pela cabeça de alguém naqueles segundos antes de. Mas Sónia tem idade e cabeça para perceber que o seu acto poderia muito bem ter arrastado muitos inocentes consigo. No método e nas consequências possíveis seria, lamento dizê-lo, igual a qualquer bombista que se faz explodir dentro de um restaurante. Se se vier a provar isto, sem qualquer sombra de dúvida, Sónia deveria ter de viver com uma consciência pesada. Se se provar o contrário, a sua tese de um acidente terrível e fortuito, aqui ficam os meus desejos de uma rápida recuperação e que saiba aproveitar esta autêntica segunda oportunidade de vida, que não calha a todos.
2 – Não sei se é verdade, como leio hoje, que a Al-Qaeda tenha Portugal na mira para mais um espectacular atentado. Sei que não é a primeira vez que ouço isto, e sei que seria uma tragédia a todos os níveis. O durante, claro, mas também o depois. Penso nisto depois de ver o “depois” na Noruega, abalada de surpresa total por dois acontecimentos terríveis em poucas horas (terrível também, a negra ironia de uma acção de grande violência num dos países menos violentos do mundo). Mas é o “depois” que me preocupa. E se na Noruega, num mar de sangue e destroços, vi calma, serenidade, concentração, organização e dignidade, nem quero imaginar por cá. Seria a altura em que provavelmente nos defrontaríamos com a inutilidade daqueles “testes” que tanto me irritam, porque os acho de conclusão absolutamente falsa: os simulacros. Esperemos, de facto, nunca ser confrontados com o cenário. Por todas as razões. Todas. E bem à portuguesa, com muitas mais que haveriam ainda de aparecer.
Nota: Por vontade do autor, este texto não segue as regras do novo acordo ortográfico