Sinceramente, nem sei bem por onde começar a falar de Joseph Blatter. Sim, o presidente da FIFA, e o espectáculo triste que deu ao mundo às custas de Cristiano Ronaldo. Nem por onde começar, nem que exactos adjectivos usar. Porque nada me preparava para as cenas ou palavras que não vi em primeira mão, e só fui ver, com atenção, depois de alertado.
Comecemos pelo essencial, que é a patetice, e depois detenhamo-nos no pormenor de mais outra patetice. O pateta, como explica o dicionário, é alguém que revela não ter bom senso. Ora o bom senso demonstrou claramente estar ausente da sala, o que permitiu a um presidente de um organismo de peso mundial dizer e fazer tudo o que não pode dizer ou fazer. Fazer comentários sobre o penteado ou pose de Cristiano Ronaldo, para a seguir dizer que prefere Messi parece-me desnecessário: já tínhamos percebido. Foi lamentável, fosse qual fosse o tom, mas quando a isto juntamos a tentativa de querer parecer um ancião bem-disposto que acompanha o ritmo dos jovens, então a cena arrepia. Blatter fez lembrar aquele pessoal mais idoso que em vez de falar com os jovens na sua voz e vocabulário normal, procura “descer” ao que ele pensa ser a sua linguagem, esforça-se por ser moderno a um ponto que nos provoca vergonha alheia. Como aqueles mais velhos que ao falar com os jovens dizem “Iá, tá-se bem, podes crer, meu, isso é bué da fixe”. Mas o que mais me impressiona, ou envergonha sempre, é assistir a tentativas de fazer humor protagonizadas por gente que não tem qualquer piada. É das situações mais confrangedoras no meu menu. Pessoas que não sabem contar uma anedota mas ainda assim avançam (normalmente enganam-se a meio, com o habitual “ah, não, espera, antes de ele entrar o amigo ainda diz… ou é o dono do restaurante?”), o que me faz sempre corar e procurar refúgio debaixo da primeira mesa.
Nota-se, aliás, que muitos dos estudantes presentes na sala do triste espectáculo não estão propriamente a rir-se do que Blatter diz, mas talvez do próprio. Bom, sobre a existência da cena, estamos conversados, quanto à falta de vergonha ou de sentido da posição que ocupa. Depois, vem a conversa que ainda dá mais para rir. Blatter dizer que nunca pensou que pudesse haver tanto falatório de uma converseta numa sala fechada ao grande público… Meu Deus… Numa sala cheia de jovens, o presidente da FIFA começa a disparatar e ninguém ia filmar? Na época dos iPhones, iPads, telefones assim e assado? Na época em que os jovens não fazem outra coisa que não seja utilizá-los e, obviamente, partilhar o mais apetecível? Na época dos facebooks, twiters, youtubes? Juntemos…ingenuidade (vamos chamar–lhe assim) às características de personalidade do senhor.
Cereja em cima do bolo: o pedido de desculpas. Telefonou a Cristiano, fez uma declaração a televisões, já recomposto do seu ar “alegre”, em que lamentou o seu comportamento, prometendo que não se repete? Não. Nada disso. “Enviou a Cristiano” uma mensagem no Twitter. Desculpem estar a rir-me, mas ainda vou dar mais uma gargalhada com a própria da mensagem, onde Blatter garante a Cristiano que nunca pretendeu fazer pouco dele ou ofendê-lo e que até o respeita muito. O que me faz tremer só de pensar como teria sido o espectáculo se Blatter não o admirasse e respeitasse… Absolutamente para esquecer, portanto. Ou melhor, lamento contradizer-me, mas deve ser absolutamente para recordar. Para recordar que é no reinado de Blatter que a FIFA tem vivido sob as mais variadas suspeitas. Para recordar que ocupar um cargo destes é mais, muito mais, do que nos tem dado. É dos livros: com grandes cargos, vêm grandes responsabilidades.
No meio de tudo isto, uma palavra para Cristiano Ronaldo: deixa andar, deixa–os falar. Primeiro, só falam de nós quando somos grandes. Segundo, porque tens sabido ser um homem com a adequada humildade à tua projecção, e que envergonha muitos que nasceram em berços de ouro. Ah, e já me esquecia daquela discussão estúpida para onde te quiseram arrastar, nas estúpidas e descabidas comparações com Eusébio. Arranjar competição onde ela não pode existir é apenas uma forma de os pequenos querem arranjar maneira de os grandes se pegarem. E os grandes não vão nisso. Porque são grandes, precisamente.