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Ensina-nos a experiência que há coisas que funcionam como um relógio suíço. Quando se trabalha em televisão há muito tempo, e muitas das matérias são recorrentes (ou melhor: repetidas), aprendemos a não nos surpreendermos por aí além. Pessoas, instituições, clubes, empresas, poucos são os que mudam o discurso. Gostam, naturalmente, de se auto-proclamar “coerentes”. Mas sermos coerentes é nunca mudarmos a agulha, haja o que houver? Não é a capacidade de mudar uma das mais sadias características da inteligência? Fica para outras crónicas, talvez.

Neste mundo previsível, destacam-se alguns partidos, naturalmente, alguns clubes desportivos, obviamente, sempre de volta das mesmas expressões e das mesmas queixas, das mesmas desconfianças e promessas, das mesmas acusações e insultos, mais ou menos velados. O que eu não esperava era a “coerência” de tantas personalidades da televisão pública. E lamento falar de uma empresa em que fui tão feliz, conheci tanta e tão boa gente, e aprendi quase tudo o que sei de televisão.

Nos últimos anos, tem sido um fartote da mesma cassete, embora não se perceba se há um manual a ler antes de dar entrevistas, ou se é já religião entranhada. Veja-se, antes de tudo, ou acima de tudo, as respostas sobre audiências que vão dando responsáveis máximos ou estrelas do canal. No tempo das vacas gordas, as audiências colocavam a RTP lá em cima. Era então ler e ouvir os sorrisos de peito cheio, que é normal que os portugueses escolham a excelência do nosso serviço, que os números mostram, naturalmente que os portugueses são adeptos da qualidade, que o serviço público não embarca nas baixezas maléficas das privadas obcecadas por dinheiro, e os portugueses reconhecem e agradecem, recompensando a estação pública impoluta com a adesão em massa aos seus programas e informação (a única que é objectiva no País).

As audiências, entretanto, mostram outra coisa, e substancialmente diferente. A RTP caiu lá para o fundo, seja na extraordinária informação, seja no óbvio serviço público dos preços certos e outros concursos, para educar o povo, e afastá-lo do ópio nocivo das privadas. Para a RTP, a queda explica-se de uma de duas formas: ou os números são manipulados e falsos e mentirosos (houve inúmeras intervenções a afirmá-lo), ou as grandes massas de telespectadores tornaram-se estúpidas.

Veja-se, a propósito, e como bom exemplo da estratégia de canal, a sucessão (sim, sucessão) de entrevistas com Sílvia Alberto. Ou muito me engano ou, recentemente, foram cinco ou seis, quase de seguida, espalhadas por jornais, revistas de TV ou revistas de moda. A primeira coisa a causar-me estranheza é ver grandes produções fotográficas, com poses várias, do sorriso inocente ao olhar mais sensual, quando a entrevistada, afirma-se logo no início dos artigos, “detesta dar entrevistas e fica nervosíssima”. Mas adiante, não é a única. Fala da carreira, perspectivas de futuro, como vê a crise no País, blá-blá, o costume. Mas ao falar do seu programa (que nunca vi e não posso avaliar) esclarece-nos que “as audiências não podem ser um medidor de qualidade”. Concluo, sem grande esforço, que as audiências são fracas. Não pode a audiência medir qualidade mas pode Sílvia, já que nos elucida que sente “uma grande felicidade em saber que o programa tem qualidade”. Como dizia já no início, o costume. O discurso não muda, nem há-de ser a realidade a mudá-lo.

Para os responsáveis da RTP, tudo o que fazem é óptimo, inatacável, e verdadeiro serviço público. Se o público gosta, é porque o público é inteligente e reconhece o que é bom. Se o público não gosta, é pobrezinho de espírito e não tem categoria para medir qualidade. Bem sei que em muito manual de autoajuda e de segredos para ter sucesso na empresa o espírito positivo é importante. Mas também deveria ser importante a capacidade de pararmos de vez em quando para pensar que, se calhar, sei lá, a malta não gosta do que fazemos porque o que fazemos não presta. Uma empresa, uma qualquer, de qualquer ramo, que nunca comete um erro, não se reavalia constantemente, não espia tendências ou procura modernidade, não escuta os sinais, venham da crítica, da inteligência iluminada de uns quantos, ou mesmo do gosto massificado de muitos outros, corre sérios riscos de se afundar cheia de razão e talento.  

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