1. Leituras apressadas dizem que Jardim sofreu um revés histórico. Factos da História: sim, é o resultado menos bom em mais de três décadas. Mas uma leitura realista, que se cinja aos números, que são afinal o que interessa em eleições, mostram bem que uma maioria expressiva dos madeirenses continua a querê-lo no poder. Quase metade dos (poucos) habitantes-eleitores do arquipélago. Coloca-se então o dilema, de decidir por onde avançar a “análise”. Jardim perdeu bastante da influência que detinha? Ou Jardim aguentou, contra todos os ataques, uma maioria absoluta? Bom, já que falamos de factos: ambos verdadeiros. Mas há, se me permitem, um travo a fim de regime indisfarçável. A televisão, com as suas indesmentíveis imagem e som, tratou de nos mostrar que Jardim venceu, mas já não convence, talvez nem o próprio. Na sua análise no “Jornal da Noite”, Ricardo Costa foi peremptório: Jardim acabará por abandonar este último mandato antes do fim. Foi ao ver e escutar Jardim, pouco depois, que percebi que é muito capaz de ter razão. O presidente reeleito apareceu desgrenhado, vestido de maneira tão informal que roçava o “estou-me nas tintas”. Reagiu sem brilho, convicção, e longe do fulgor de disparos vários que caracterizou toda a sua campanha de acossado. Jardim, está, inegavelmente, cansado. Porque são muitos anos, certamente, porque já não é novo, absolutamente, mas porque ele, melhor do que ninguém, saberá, no seu íntimo, que esta campanha deixou mossas que não vão desaparecer tão cedo. E sabe, melhor do que ninguém, que, apesar de ter dito em campanha que isso das contas furadas era folclore, esse buraco vai acompanhar e condicionar o novo Governo. Jardim só não saiu mais cedo porque gosta de levar um combate até ao fim. Porque abandonar a meio de uma campanha seria uma enorme admissão de desgaste e culpa. Mas aquilo que vimos, após a vitória, não foi um vencedor pronto para mais duras batalhas. Foi um homem cansado a preparar o fim da linha.
2. Há indícios fortes de tráfico e usos de drogas de “figuras do mundo do espectáculo e televisão”. A detenção de um skinhead ligado a uma claque do Sporting levantou a ponta do véu. A fazer fé no que me diz um jornal, este alegado traficante de 37 anos andava num corrupio de fornecimento, com um esquema bem montado de estafetas que funcionavam como correios de entregas periódicas (diárias, em alguns casos). Alguns teatros, mais o Coliseu, mais uma estação de televisão. Não é a maior novidade do mundo que figuras do show-business estejam ligadas ao meio, ou que sejam clientes regulares. Não são, necessariamente, mais ou menos do que qualquer outro agarrado ao vício. E fazem parte do folclore, mais ou menos imaginado e aumentado, de que o mundo do espectáculo “é mesmo assim”. Pessoalmente, pouco me importa quem são ou porque o fazem, mas continuo a achar que no chamado mundo do espectáculo ainda há responsabilidades variáveis. E digo isto porque se convencionou, desde há muito tempo, colocar nesse saco os jornalistas de televisão, pelo menos os que são mais visíveis, reconhecíveis e reconhecidos. Porque os jornalistas televisivos têm, quase todos, de informar, em tantos dias, que o tráfico de droga isto e o tráfico aqueloutro, e que o consumo de estupefacientes assado, e tudo isto sempre com o nosso melhor ar grave que demonstra, e bem, uma condenação implícita. E é por isso que espero que em toda esta história de bas-fond e baixaria não venha a surgir, para além de qualquer dúvida, qualquer nome de jornalista que eu tenha visto e ouvido a tecer grandes considerações sobre os “perigos da droga” e a anunciar, ufano, uma das maiores apreensões que deu uma machadada no tráfico, esse malandro que corrompe e envenena a nossa juventude. Dir-me-ão que uma coisa é a nossa profissão, outra a nossa vida privada. Concordo. Mas está na altura de, sobretudo os milhares de jovens aspirantes à minha profissão, entenderem que há uma sobreposição moral incontornável, sem a qual, aliás, não há declarações de “credibilidade e seriedade” que nos valham.