Manuel Carvalho da Silva merece-me uma palavra na hora em que abandona o palco mediático (por agora…). Atravessou, literalmente, toda a minha vida profissional. Vinte cinco anos de dedicação extrema a uma causa pedem aplauso, sobretudo quando se pensa na coerência que demonstrou, nas mais variadas situações do País, perante tantos governantes que teve de enfrentar. Interessa pouco se somos ou não da mesma família política: ainda mantemos esperança neste país quando vemos e ouvimos alguns interessantes depoimentos sobre o líder sindical, numa reportagem da SIC, precisamente vindos daqueles que poderiam ser considerados os seus “inimigos”, simplesmente porque estiveram do outro lado da barricada de tantas e tantas negociações. Mas não, felizmente. O que se ouviu foram elogios à sua verticalidade e educação. Muitas vezes levantou a voz mas raramente o vi irado. Muitas vezes afirmou frontalmente uma discordância ou fez apelos gritados a uma luta contra perdas de direitos, mas nunca lhe vislumbrei rastilho de violência. Alguém na reportagem dizia, de resto, que a manutenção civilizada de décadas de diálogo entre Governo, patrões e sindicatos muito deve ao homem que agora abandona a liderança da CGTP. Na hora da despedida, não queria deixar de lhe prestar homenagem. Jornalistas e sujeitos da notícia são vistos, erradamente, como pessoas que se movem em posições antagónicas. Não é, nem deve ser verdade. Como não é, felizmente, entre políticos que defendem a esquerda ou a direita. Podem e devem respeitar-se mutuamente.
E quis o destino jornalístico, tão imprevisível como tantas vezes irónico, que no dia em que eu apresentava o “Jornal da Noite” que se concentrava, precisamente, na despedida de Carvalho da Silva, o País fosse confrontado com uma gaffe absolutamente embaraçosa para todos, a começar pela SIC, naturalmente. Uma das frases de rodapé apresenta-se, de repente, com um erro no nome do líder da CGTP. Precisamente o erro mais temido: aquele que, com a simples falta de uma letra, transforma um dos seus apelidos numa das obscenidades mais estrondosas da língua portuguesa. Demorámos alguns segundos a dar pelo erro, após o que a situação foi normalizada. Logo a seguir ao “Jornal”, prevendo que Carvalho da Silva estivesse bastante atarefado nos trabalhos do congresso, pedi a um dos nosso repórteres no local que lhe apresentasse, em nome da Direcção de Informação da SIC, as nossas mais humildes desculpas pelo lapso que faz corar. O que aqui reafirmo. Mal eu sabia, como vim a perceber poucos depois, que já havia nas chamadas redes sociais da Internet um enorme “pagode” com a nossa gralha, difundida e reencaminhada até à exaustão, com os inevitáveis comentários a preceito. E aqui é que entramos num terreno que, está visto, não tem emenda no País. Acontecem passos em falso, erros, gralhas, pontapés na gramática, muitas mais vezes do que seria aconselhável, em todos os canais, a todas as horas. Desses atropelos à Língua Portuguesa, com ou sem acordo ortográfico, raramente vejo qualquer reacção. Mas bastou o picantezinho de uma asneirola para a malta da Internet desatar em histeria. E julgava eu que seriam difusões e comentários de crianças e adolescentes, para quem há sempre uma excitaçãozinha de transgressão com escatologias ou obscenidades. Pensava eu que só criançolas se conseguem divertir a dizer ou a escutar “chichi” ou “cocó”, ou com o eclodir de gases ou arrotos. Mas não. Pela simples amostra do que me deram a ver, para me mostrarem a “dimensão” que a nossa gaffe já ganhara, não falta por ali gente adulta (alegadamente adulta) a partilhar risinhos e faces coradas com o erro da SIC. Vejamos: a gaffe é lamentável? Claro que é. Merecem desculpa os telespectadores que se possam sentir ofendidos pela visão da palavra, merece desculpas o próprio Carvalho da Silva, que viu o seu nome mal escrito, da pior forma que pode vir mal escrito? Claro que sim. Apresento, a todos, as nossas desculpas. Mas agora, se me perdoam, passemos à frente, que há coisas bem mais importantes. E acrescento: um dia marquei mesa num restaurante que desconhecia, pelo telefone. O gerente reconheceu-me a voz, pelos vistos, porque quando chegámos à imponente sala lá estava um enorme letreiro na nossa mesa, que anunciava, orgulhoso, o meu nome, e que toda a gente que chegou antes de nós teve oportunidade de ver. Com um simples senão: exactamente da mesma forma, faltava uma letrinha no Carvalho do meu nome. Por experiência própria, sei que não é agradável, como sei que é maior o embaraço de quem escreve a gaffe do que o do visado.