Avanço com duas informações que, aparentemente, não têm qualquer ligação. Uma: não tenho nada contra operações plásticas. Duas: gosto pouco que façam de mim estúpido. A primeira é simples, e tem a ver com a força da liberdade. Que cada um faça o que entende. Acresce que os progressos da tecnologia, ciência e medicina são para aproveitar. A senhorita está descontente com as rugas no pescoço, com os pés-de-galinha que sulcam os olhos? Há solução. O senhor já não suporta piadinhas sobre a sua barriguinha flácida? Lipoaspire isso em minutos. É aproveitar, que aqui há uns anos não havia nada disto, e a gente envelhecia normalmente, sem qualquer pudor, à vista de toda a gente… A liberdade, dizia eu, é muito bonita e saudável. De regresso à segunda ideia, há depois toda uma legião de mulheres e homens que fazem tudo isto, mas insistem em querer convencer-nos que não. Ou seja, que estamos perante uma intervenção divina, um milagre inesperado e não um bisturi. Alexandra Lencastre quis passar para a cabeça deste pelotão. Vem no seguimento de inúmeras más disposições, depressões e outros ões que, volta e meia, utiliza para que se volte a falar dela nas revistas. Um jogo que ambas, Alexandra e a revista, adoram. A reputada actriz “não andava bem há algum tempo”, segundo relatam fontes próximas. Recolheu ao recato por um período, para regressar outra pessoa. Dito de outra forma, Alexandra foi fazer uma intervenção plástica, cuja técnica me escapa, mas que lhe deu outro rosto (e talvez algo a mais ou a menos que as roupas escondam). Não foi a primeira vez. Já tinha comprado um peito generoso que fez questão de partilhar connosco em diversas ocasiões públicas. A nova mulher que foi um dia Alexandra Lencastre foi fotografada com a sua nova cara, foto que foi rápida e largamente difundida. Numa primeira fase, Alexandra não quis comentar se tinha feito ou não uma operação plástica. Só esta atitude já é extraordinária, porque revela que pensará que há pessoas que ainda estarão na dúvida. Uns dias depois, numa festa em que sabe que estarão dezenas de fotógrafos e repórteres que habitualmente cobrem o nosso “mundo artístico”, Alexandra quebra finalmente o silêncio. Para dizer que sim, que fez uma operação plástica porque lhe apeteceu, que se sente melhor assim, que se está a marimbar para o que os outros pensam? Não, isso seria uma resposta normal de uma pessoa segura de si. À pergunta, Alexandra responde “nim”, não assume seja o que for, mas faz questão de nos elucidar que “há papéis que exigem uma transfiguração”, parecendo referir-se, como elucidam os repórteres da especialidade, a um papel invulgar e exigente que há-de representar na sua septuagésima novela. Sim, claro, quem somos nós para duvidar? Se Robert De Niro engordou como um porco para encarnar a decadência de Jake La Motta em “Touro Enraivecido”, se Tom Hanks se deixou emagrecer a nível alarmante para nos convencer da fome que passava em “O Náufrago”, como não perceber logo que Alexandra é também uma maníaca do seu profissionalismo? Depois, há toda a descrição e fotos a condizer do seu comportamento na festa, em que, entusiasmada pelos elogios que nos garantem que foi recolhendo, desatou nas correrias suadas e “demonstrações de sensualidade” que escolheu para imagem de marca nos últimos anos. Muita sorte tem tido que a imprensa com quem mais se dá tenha escolhido ser boazinha e compreensiva com ela, achando-lhe graça e incitando-a a mais (sempre se vão enchendo mais páginas). Por mim, prefiro Lili Caneças, ou até a taróloga Maya, que partilharam connosco as suas opções, do peeling facial às mamocas XL que já não descaem, antes que se tornasse penoso e ridículo negarem o evidente. Antes que nos tentassem convencer que não sabem o que se passou, mas uma de repente acordou, foi ao espelho da casa de banho e tinha a carinha toda esticadinha, e a outra não sabe também como, talvez da posição em que dormiu, quando deu por ela tinha uma peitaça toda rijinha. Não assumir, nestes casos, é duplamente pateta. Não se combate uma insegurança com mais uma insegurança. E sentirmo-nos realmente bem connosco, com ou sem recauchutagem, é a melhor prenda que podemos dar a nós próprios.
Antes a Lili Caneças
Sentirmo-nos realmente bem connosco, com ou sem recauchutagem, é a melhor prenda que podemos dar a nós próprios